23 de out. de 2010

23 DE OUTUBRO, DIA DO AVIADOR - UMA HOMENAGEM AO CMTE. RIOS

 (da direita para esquerda. Cmtes. Leir, Emerson e Rios)
Ele nos deixou há poucos anos, mas tive o prazer de compor sua tripulação e até ser seu ala em simulador, apesar de sua extrema exigência escolheria fazer tudo com ele novamente. Cmte. Rios não era, é uma lenda até hoje.  



(Cmte Rios e a comissária Marcela) 
Coincidentemente serviu na Brigada de infantaria Paraquedista onde, muitos querem, poucos tentam, e só alguns conseguem.

Com certeza esse foi um dos motivos que nos unia, porque acredito que uma amizade é superficial quando não baseada em uma experiência comum.


Rios era dono de frases e bordões históricos, quem conviveu com ele sabe.

Abaixo divido com vocês em dois lances excelentes crônicas escrita pelo meu amigo aviador Emerson Freire.


CRONICA PARA AMIGOS MEUS E DELE EM DOIS LANCES - PARTE I


Hoje, justo hoje, dia do aviador, foi um dia atípico.
Ontem já dormi programado para acordar na hora certa para voar. Tão normal de todos nós, mas foi diferente...
Despertei cinco minutos antes de o relógio me agredir.
Abri os olhos, nítidos, como se acordado já estivesse a muito.
Acendi como se a consciência não estivesse por horas ausente de mim. De mim e do mundo.
Para meu espanto não me esqueci do que sonhei, do que fiz, do que falei.
Virei de lado, deitei em cima do braço e senti um pesar tão forte, que quase desisti de levantar.
Foi o pesar da ausência. A invasão inesperada e inadvertida da saudade, de arroubo, porta a dentro da alma.
Por fim respirei, levantei, me aprontei, beijei o travesseiro da mulher que amo e fui, porta a fora dessa vez, ao deleite divertido do oficio escolhido.

Mas senhores, preciso dividir com vocês: Que saudade súbita do Cmt Rios!

Sonhei como se não tivesse mesmo dormido.
Conversei como se o melhor dos tempos não tivesse ido.
Como se tivesse estado sempre aqui. E eu estado lá.
E o tempo para nosso sabor ao alcance da mão, dos dedos que telefonam pra marcar cafezinho na praça tão só dele “dos intelectuais”.
Nossa, meus amigos, que saudade do Cmt Rios...
Antes de sair, “escavaquei” meus livros. Virei, mexi e afastei. Achei o que precisava. Achei o poema do Rios.
Não creiam, mas eu tenho e li a obra poética completa do Manuel Bandeira.
Aprendi cedo que um poema é o refugio do espírito e o acalento da alma.
La estava. “A Mario de Andrade Ausente”. Esse é para mim o poema do Rios.
É a demonstração absoluta do valor da ausência dos sem preço. Dos que permanecem sem estar.


“Anunciaram que você morreu.

Meus olhos, meus ouvidos testemunharam:
A alma profunda, não.
Por isso não sinto agora a sua falta.

Sei bem que ela virá

(Pela força persuasiva do tempo).
Virá súbito um dia,
Inadvertida para os demais.
Por exemplo assim:
À mesa conversarão de uma coisa e outra.
Uma palavra lançada à toa
Baterá na franja dos lutos de sangue.
Alguém perguntará em que estou pensando,
Sorrirei sem dizer que em você
Profundamente.

Mas agora não sinto a sua falta.

(É sempre assim quando o ausente
Partiu sem se despedir:
Você não se despediu.)

Você não morreu: ausentou-se.

Direi: Faz tempo que ele não escreve.
Irei a São Paulo: você não virá ao meu hotel.
Imaginarei: Está na chacrinha de São Roque.

Saberei que não, você ausentou-se. Para outra vida?

A vida é uma só. A sua continua
Na vida que você viveu.
Por isso não sinto agora a sua falta.

Sempre achei que Manuel Bandeira entendia de mulher, de morte e de saudade.
Agora tenho certeza.

CRONICA PARA AMIGOS MEUS E DELE EM DOIS LANCES - PARTE II


Passei o dia e o vôo com meias ou poucas palavras. Eu não estava muito ali.

Às vezes você esta e sua alma não.

Lembrei-me de tantas passagens. De engraçadas a pitorescas.

Acho que o Rios hoje visitou os que o amavam.

Acho que se dividiu conosco. Ou melhor, se juntou.

Provavelmente ele visitou cada um de nós, a sua maneira.

Lembrei-me das aulas sistemáticas em vôos noturnos demorados cruzando o Acre.

As famosas aulas conspiradoras do Cmt Rios. Todas muito divertidas.

Eu novinho, vindo de Brasília, romântico leitor de Álvares de Azevedo e Augusto do Anjos.

Fácil saber o tema das aulas não ? Pois conto: Dissociação de sexo e amor.

Era mesmo um sujeito divertido.

Foi pai de muitos. Perdeu filho e deixou outros tantos. A amizade é um tipo de paternidade.

Eu sou afortunado. Eu e mais alguns, saboreamos sua companhia nesses anos de ouro.

Felizes são aqueles que o Rios gostou de verdade.

Esses amargaram também, serem os mais maltratados.

Não me perguntem por que era assim, mas era. E la estávamos nós. Caninamente fieis.

Confidencio a vocês: Ate hoje secretamente não gosto de quem o Rios não gostava.

Mesmo na sua chatice estávamos lá. E chato ele sabia ser. Fazia bem quando queria.

Achava o ponto fraco dos frágeis e la entrava com arte. Vi muito isso. Vi e vivi...

Mas ainda assim, que pessoa extraordinária era essa, que mesmo por vezes o mais mais, dos chatos, queríamos tão bem, tão perto, tão junto.

Ainda assim era tão querido, tão influente e tão referente.

Por mim digo que aprendi sim e muito. Fui apadrinhado. Tirei a sorte grande.

Aprendi com ele grande noção de ética e decência.

Quem poderia falar mal do Rios ?

Certamente alguém, porque ele não era unanimidade.

Daí vem seu caráter admirável. Ser unanime seria suspeito e reprovável e esse não era o Rios

Suspeitos são os contra ele. E notadamente, tendencioso sou eu.

O Rios era assim, como as ameixas, ame-as ou deixe-as. Palavras de Leminski

Por fim o “Rala” foi tão humano. Foi tão tropeços, quanto nós.

Tão errante em exemplo, quanto os que ele ensinou e esquerdistamente catequizou.

Tão humanamente se apaixonou pelo errado. Mas afinal, quem não fez na vida escolhas descabidas ?

Algum dentre nós não fez em algum momento?

A dele o consumiu.

Hoje penso que ele deveria ter lido um bom bocado de Nelson Rodrigues.

Transformaria sua epopéia errante em tragicomédia nelsonrogriguiana.

Riria outro bocado, passaria a diante e estaria ainda hoje, para nossa fortuna, entre nós...

Preciso dividir com vocês, porque só vocês vão entender :

QUE SAUDADE DO RIOS!


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