DE SÃO PAULO
Inconformado com a impunidade do estuprador de sua filha caçula, o comerciante J.C.M., 57, morador de Birigui (a 507 km de São Paulo) investigou por conta própria o crime, provou que o autor era um rapaz da cidade, localizou onde ele se escondia, em Portugal, e conseguiu que a Interpol o detivesse.
Agora, depois de sete anos, J.C.M. aguarda a extradição do criminoso para o Brasil, onde ele deverá ser julgado pelos crimes de roubo, sequestro e estupro. "Eu não descansaria enquanto não conseguisse", disse J.C.M. A Folha não teve acesso ao acusado.
Estou mais feliz do que se ganhasse na Mega-Sena. Nunca vou esquecer o dia 18 de outubro, às 12h48, quando me informaram que o estuprador de minha filha tinha, enfim, sido preso em Portugal e seria extraditado para o Brasil. Era o fim de uma caçada de mais de sete anos.
Eu aguentaria mais sete, mais 14, mais 21 anos. Eu não sossegaria enquanto não o levasse para a prisão.
Thiago Esteffanato/O liberal
Inconformado com lentidão das investigações sobre estupro de filha, empresário buscou provas por conta própria e conseguiu localizar o culpado; acusado foi preso em Portugal neste mês.
O sofrimento de minha família começou em julho de 2005. Minha filha, então com 21 anos, acabara de se encontrar com o namorado, e estava no carro dele, quando dois rapazes em uma moto se aproximaram e renderam-nos sob a mira de revólver.
Parecia um assalto. Foi pior. Levados a um lugar ermo, minha filha e o namorado foram obrigados a ficar dentro do carro. A.O., então com 27 anos, pediu para seu cúmplice esperar perto da moto. Ele voltou para o carro e, na frente do namorado dela, estuprou minha menina.
Antes de abandonar os dois, A.O. roubou-lhes os celulares e R$ 85.
Prestamos queixa. Foi coletado o sêmen deixado pelo estuprador, ela foi medicada.
No dia seguinte, prenderam os dois. E fomos para o reconhecimento. Mas minha filha estava tão traumatizada, tão assustada, tão sofrida, que não conseguiu reconhecer o estuprador. O namorado dela também não.
Mas já naquele dia soubemos que outras duas jovens, muito parecidas com minha filha, tinham sido estupradas na cidade. E nas mesmas condições. Ele era um estuprador em série.
Mergulhei na história de cada suspeito. Frequentei os piores lugares que você possa imaginar, como pontos de drogas. Falei com bandidos de todas as espécies.
Você sabe, o estupro é um crime que nem os bandidos toleram. E eles foram me contando as coisas que sabiam sobre A.O.: que ele era ladrão de moto, assaltante de ônibus de excursão, estuprador.
Firmei a convicção de que, sim, tinha sido ele quem havia estuprado a minha filha. Restava provar.
Em 2007, a Justiça arquivou o caso. Ia ficar assim? Mesmo desesperado, não desisti.
Descobri que A.O. tinha uma ex-mulher e um filho em Birigui (a 507 km de São Paulo). Corri até o delegado e pedi-lhe que solicitasse um exame de DNA no menino. A ex-mulher ajudou muito, porque ela prefere ver o capeta a encarar A.O. novamente.
Confrontados o DNA do menino e o sêmen encontrado em minha filha, e não restou nenhuma dúvida. A.O era o estuprador.
Em 2010, o Ministério Público pediu a prisão de A.O.. Mas ele já se havia mudado para Portugal, onde arrumou um emprego em uma agência de publicidade, casou-se com uma brasileira e teve mais um filho.
Para escapar da extradição, mudava de endereço toda hora. Soubemos então que ele estava na rede. O jeito foi usar as redes sociais e um detetive para rastreá-lo. Há um mês, consegui o endereço. Eu sabia tudo o que ele fazia. Ele se mexia, eu ficava sabendo.
Telefonei para Portugal e, quando ele atendia, eu dizia: "Faz um buraco no chão e se enterra, porque enquanto eu não te pegar, não vou parar".
Nunca me passou pela cabeça fazer justiça pelas minhas mãos. Meu problema sempre foi como fazer esse homem responder perante a Justiça por todo o sofrimento que impôs a minha filha e a minha família como um todo.
Minha filha estudava mecatrônica. Tão abalada ela ficou, que teve de largar a faculdade por dois anos. Viveu à base de calmantes.
Hoje, está bem. Formou-se em farmácia, casou-se [não com o namorado da época], é gerente de banco e tem um filhinho de um ano.
Muita gente me dizia para eu parar, esquecer, deixar para lá. Mas eu não poderia fazer isso. Agora, e só agora, posso retomar minha vida, confiante de que a Justiça fará A.O. pagar pelos seus crimes e pela dor que causou.
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