11 de dez. de 2008

Homero, "Um aviador em um país milenar e encantado"



Minha gente querida do Murú & Tarauacá , estamos por aqui de novo . Escrevo prá vocês um dos últimos , senão o último relato da Índia . A Partir de 2009 vou estar respondendo por um novo endereço – ainda por ser definido . Prometo mantê-los informados .

Acabo de voltar do Festival popular de Pushkar , em pleno deserto do Thar . É uma festa que acontece anualmente dependendo do calendário lunar , onde se reúnem cinquenta mil camelos . Isso mesmo : cinquenta mil ! Apesar te tudo por lá cheirar a cachorro molhado , é uma experiencia inesquecível e bonita . O povo das aldeias se encontra prá colocar o papo em dia , arranjar os casamentos do ano , negociar comida e artesanato . Os jantares são coletivos em volta de enormes fogueiras , rola muita dança e uns malabarismos abusados com espadas . Sentar no chão e comer com as mãos numa folha de bananeira com todo mundo , sem diferença ( e sem estar sendo turista ) é muito bom , acreditem .

Ainda vou escrever um dia sobre os pequenos festivais locais da Ásia . É inimaginável o que acontece por aqui . Em Udaipur , no Rajastão , se festeja anualmente o fim da batalha que o Marajá Rana Pratab travou contra os Haldighati , em 1576 . Ele cavalgava um cavalo branco chamado Chetag , e foi ferido por um elefante-de-guerra ( o precursor do tanque de guerra , eu suponho ) . Muito bem , o Chetag era muito inteligente e destemido ; depois de perder uma pata ainda resgatou o seu dono ferido e o arrastou para fora do conflito . Só morreu depois que viu que o Maharaja estava a salvo . Conclusão : Ganhou estátua , festival e um templo , onde se celebra sua coragem e pede-se proteção . Não ao Marajá , mas a seu cavalo ! Não são poucos os seguidores do Chetag hoje em dia por lá ...

Em Delhi ví várias pessoas correndo descalças na estrada , carregando um copo d´água e seguidas por caminhões cheios de gente . De tempo em tempo alguém pulava da caçamba , assumia o copo e revezava-se na corrida . A explicação era a seguinte : Um templo em Gurgaon , alí perto , recebe mil litros de água de um poço “santo” a mais de duzentos quilômetros de distância num período de uma semana , durante –adivinhe - outro festival religioso local , tão corriqueiro que ninguém soube me dizer o nome . Mil litros d’água , copo-por-copo , de devotos que não podem parar de correr . E isso vem acontecendo a séculos .

Um dos maiores feriados nacionais da Índia é o “Diwali” que aconteceu no fim do mês passado . É a chamada festa das luzes , quando acendem-se velas e trocam-se presentes . Tipo o nosso Natal , só que dura quase uma semana inteira . Milhões de fogos de atifício , música , dança nas ruas . Todos saem de casa prá celebrar , as ruas ficam cobertas de flores e luzes . O cheiro de pólvora , “masala” , aniz e açafrão perdura pelas semanas seguintes .

E também o Holi Festival , sobre o qual já escrevi . E milhares de outros , nacionais e locais , todos religiosos . “Procissão” e “peregrinação” por aqui , num país com um bilhão e meio de habitantes , são sempre levados muito a sério .

Vocês devem ter ouvido falar dos conflitos com os cristãos no sul da Índia . Rapaziada , o negócio é muito mais complicado do que parece . Os Hindús se revoltaram e andaram promovendo uns quebra-quebra por aqui . Um hindú convertido ao cristianismo tem que praticamente renunciar à toda a sua vida : Seu nome é religioso , sua rotina diária inclui centenas de pequenos rituais , solitários e coletivos – e isso inclui sua família , filhos , vizinhos , colegas de trabalho . Ser hindú significa ter nascido hindú , não é só uma religião .

OK ... Terrorismo . Esse é um capítulo muito triste . Sei que vocês acompanharam os episódios recentes em Mumbai e assim como eu não entenderam nada . Posso dizer , para simplificar , o seguinte : Somos privilegiados por termos a Argentinos como vizinhos ... e ter toda a rivalidade com eles resumida ao futebol . E podermos contar piada de argentino sabendo que eles contam piada de brasileiro por lá .

O Processo de independência da Índia foi um dos maiores desastres registrados pela História contemporânea . Sob o patrocínio inglês , estima-se que quarenta milhões de pessoas tenham morrido no decorrer das duas semanas destinadas a separar geograficamente muçulmanos e hindús em 1947 , criando as repúblicas da Índia e Paquistão , simultâneamente . O problema é que as diferenças têm raízes muito profundas , some-se à isso o espaço que os extremistas islâmicos têm no Paquistão atualmente ... o resto é consequência . Infelizmente .

E em respeito às vítimas – entre elas alguns meus conhecidos – vamos ficando por aqui , sem muita gracinha . E um grande abraço e um ano novo cheio de sucesso para o nosso Acre .

Homero

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