20 de jul. de 2014

A PRAÇA DE MANAUS - PARTE I


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novomilenio.inf.br - Ao longo dos séculos, as povoações se transformam, vão se adaptando às novas condições e necessidades de vida, perdem e ganham características, crescem ou ficam estagnadas conforme as mudanças econômicas, políticas, culturais, sociais. Artistas, fotógrafos e pesquisadores captam instantes da vida, que ajudam a entender como ela era então.


Um volume precioso para se avaliar as condições do Brasil às vésperas da Primeira Guerra Mundial é a publicação Impressões do Brazil no Seculo Vinte, editada em 1913 e impressa na Inglaterra por Lloyd's Greater Britain Publishing Company, Ltd., com 1.080 páginas, mantida no Arquivo Histórico de Cubatão/SP. A obra teve como diretor principal Reginald Lloyd, participando os editores ingleses W. Feldwick (Londres) e L. T. Delaney (Rio de Janeiro); o editor brasileiro Joaquim Eulalio e o historiador londrino Arnold Wright. Ricamente ilustrado (embora não identificando os autores das imagens), o trabalho é a seguir reproduzido, em suas páginas 972 a 978, referentes ao Estado (ortografia atualizada nesta transcrição).

Teatro do Amazonas
Foto publicada com o texto, página 972
Considerado do ponto de vista da extensão, é o Amazonas o primeiro entre os vinte e um estados e territórios da União. Estende-se pela superfície de 1.897.020 quilômetros quadrados, e confina com seis países estrangeiros.

Ao Sul, limitam-no o estado de Mato Grosso, a República da Bolívia e o Território do Acre; ao Oeste, o Peru, Equador e Colômbia; ao Norte, Venezuela; a Leste, a Guiana Inglesa e o estado do Pará. Tem uma população de 400.000 habitantes, não avaliada em dados seguros.

Este estado divide com o do Pará o poderoso Rio Amazonas; mas tem uma parte muito maior desse rio do que o Pará e é a unidade político-geográfica que dispõe da mais extensa superfície fluvial do mundo.

Quando Portugal, na primeira metade do século XVI, dividiu o Brasil em Capitanias ou províncias desiguais, o Amazonas não foi incluído, e só depois de 1636 se estabeleceu na embocadura do imenso "mar de água doce" a Capitania de Joannes, hoje Ilha de Marajó.

Quem primeiro descobriu o Rio Amazonas foi o espanhol Vicente Yanez Pinzon, companheiro de Colombo, que explorou a costa do Norte do Brasil e reconheceu o estuário. Em 1519, Gonzalo Pizarro, irmão do conquistador do Peru, partiu do Pacífico em busca do El-Dorado que, embora ainda hoje no domínio da fantasia, empolgou a imaginação e credulidade da Europa por meio século.

Pizarro não foi longe, mas o seu lugar-tenente Orellana, traindo-o, quando a sua expedição estava nos maiores apuros, abandonou-o e, com alguns homens, desceu por um dos principais braços do Amazonas, o Rio Napo, que nasce nos flancos do Cotopaxi, nos Andes. Com incrível felicidade, Orellana navegou todo o curso principal até o Atlântico, seguindo depois para a Espanha, para onde levou maravilhosas lendas, grandemente exageradas como de costume.

Entre elas, contava-se a das mulheres guerreiras (também atribuída a Gonzalo Pizarro, que teve de explicar as causas do insucesso da sua expedição), donde o grande rio tirou o seu nome Amazonas, dado depois, como vimos, ao maior estado do Brasil.

Um século depois, outro espanhol, Juan de Palacios, partindo de Quito, Equador, chegou à confluência do Napo com o Amazonas, continuou até a entrada do Rio Negro e foi morto pelos índios. Os companheiros que se salvaram conseguiram alcançar Belém, fortaleza fundada pelos portugueses no estuário.

Dirigida pelo capitão geral Velho de Carvalho, partiu de Belém, rio acima, uma expedição em 1637, que depois de um ano de quase incríveis aventuras, chegou a Quito em 1638. Espanha e Portugal estavam então sob uma só coroa, e os pioneiros foram entusiasticamente recebidos. Esta foi a primeira expedição bem sucedida na travessia do continente, nesta latitude, de Leste para Oeste, e a sua ousadia e sucesso estão no mesmo nível do colossal trabalho dos brasileiros, na última metade do século XIX, no Amazonas.

Voltando a Belém, em 1639, Teixeira, chefe da expedição, levantou um marco na foz do Rio Napo, como sinal da ocupação do país pelos portugueses - fato que, devido à separação entre Portugal e Espanha, no ano seguinte, foi um dos principais argumentos aduzidos por Portugal para provar o seu direito a toda a bacia do Amazonas até aquele ponto.

Em 1625, os holandeses estabeleceram uma feitoria no Xingu, um dos afluentes do Amazonas, mas foram, com outros aventureiros, gradativamente expulsos pelos portugueses, que conseguiram alcançar o completo domínio do rio, cuja livre navegação fecharam aos estrangeiros. Só depois de 1867 o Amazonas foi de novo franqueado ao mundo.

Até 1822, quando o Brasil se fez independente como Império, o território, agora conhecido por Amazonas, formava parte da Capitania do Pará, com uma sub-capitania S. José do Rio Negro, estabelecida em 1755. O 1º governador, Joaquim de Mello das Póvoas, fez de Barcelos o seu quartel-general, no vale do Rio Negro, acima da cidade de Manaus, sendo Barcelos uma das muitas povoações fundadas pelos jesuítas nesta região.

O 3º governador, Manuel da Gama Lobo, transferiu a sede do governo para a Barra do Rio Negro, hoje Manaus - capital do Amazonas -, então uma simples vila missionária. Depois da independência, em 1822, os habitantes do Rio Negro bateram-se pela sua autonomia e estabeleceram um governo provisório; mas, tendo sido subjugados, foi Rio Negro de novo incorporado, em 1832, como comarca da Província do Pará. Contudo, continuaram a protestar, e em 1850 conseguiram uma lei que separava da Província do Pará a Comarca do Rio Negro, elevando-a à categoria de província sob a denominação de Amazonas, em 1º de janeiro de 1852.

A Vila da Barra do Rio Negro, elevada a cidade, que por uma vizinha tribo de índios foi de novo batizada com o nome de Manaus, ficou sendo a sede do governo. Em 1774, Manaus era uma pobre vila missionária; em 1848, mais ou menos na ocasião da primeira visita de Bates, contava 3.874 almas, das quais 234 escravos, e toda a comarca não rendia mais de 300 libras de impostos.

Hoje em dia, como podemos ver, Manaus é uma bela cidade iluminada à luz elétrica, com cerca de 70.000 habitantes, excedendo a um milhão esterlino a receita da ex-comarca, hoje um gigantesco estado.

Até 1853, a navegação do Amazonas era feita por batelões, que levavam muitas semanas a chegar ao Rio Negro, tendo o governo central sistematicamente proibido a navegação a vapor naquele rio.

Contudo, em 1852, o visconde de Mauá, o mesmo homem que dirigiu a construção da primeira estrada de ferro no Brasil, obteve um monopólio de navegação a vapor no Amazonas; e nesse mesmo ano foi organizada a Companhia de Navegação e Comércio, com o capital de 4.000 contos de réis.

Vinte anos mais tarde, depois de ser franqueada ao mundo a navegação no Amazonas (1872), essa companhia se transformou na atual Companhia de Navegação a Vapor do Amazonas, hoje pertencente a ingleses, que tão bons serviços há prestado ao desenvolvimento desta região.

Daquele ano em diante, o progresso tem sido rápido, e, por cerca de 1874, começou a correr uma linha subsidiada de vapores entre Liverpool e Manaus, outra para os Estados Unidos em 1872, e uma 4ª para o Rio de Janeiro e portos de escala em 1884, enquanto que a arrecadação de impostos diferenciais dos produtos embarcados diretamente, ou via Pará, completava a emancipação comercial e política do Amazonas, do vizinho estado do Pará, do qual permaneceu como presa por tão longo tempo.
Um trecho do Rio Negro
Foto publicada com o texto, página 973

Em 1889, com a proclamação da República, a província se tornou o autônomo estado do Amazonas, dirigido no que concernia aos negócios internos por um governador e uma Constituição própria.

Contudo, é interessante recordar a condição administrativa e financeira deste maravilhoso território, nas palavras do último presidente da ex-província, dirigidas à Assembléia Provincial em 1889. Declarou ele que a província estava "sem orçamento, sem polícia ou governo municipal, sem dinheiro e sem crédito". Depois de 10 anos apenas de existência autônoma, pôde o governador, em 1898, com legítimo orgulho, anunciar uma receita de 21.426:000$ (£616.587, segundo a taxa oficial de 7⅛ d. por mil réis).

Cumpre observar que, durante as épocas de câmbio baixo, o mil réis era sempre de maior valor nos estados do que no Rio de Janeiro; de sorte que o equivalente da receita estadual, em libras, era de fato mais do que indica o câmbio oficial.

Durante a mesma época, Manaus se transformara, de miserável vila que era, em uma das principais cidades do Brasil. Decerto, nem tudo é devido à emancipação política; o tempo e as exigências da indústria e comércio, que encontram no Amazonas um manancial inesgotável, têm tomado parte influente nesse desenvolvimento. Mas é fato que, sem liberdade de agir e se desenvolver, por si, e sem a livre navegação fluvial, o Amazonas jamais atingiria o grau de prosperidade, de que hoje se ufana.

Como, na sua interessante obra A Terra do Amazonas, fez notar o barão de Sant'Anna Nery: "A causa e efeito do desenvolvimento do comércio no estado do Amazonas é a facilidade do transporte. Em 1872 entraram 51 vapores; em 1906 o número atingiu a 1.248". A franquia do colossal rio foi o ponto de partida do progresso do Amazonas, aumentado pela sua subseqüente independência do Pará.

Palácio da Justiça
Foto publicada com o texto, página 974

Examinemos agora mais de perto a configuração, o clima, os produtos e o povo deste fascinante estado do Brasil. Quem tiver lido Bates, o incansável e modesto naturalista, quem tiver lido as suas memórias de onze anos no Amazonas, decerto adquirirá um grande desejo de ver este estado; e não só a obra de Bates inspirará o ardente desejo de conhecer estes vastos e virginais domínios, mas também outras, não menos notáveis, como a do almirante brasileiro barão de Teffé von Hoonholtz, que explorou o Javari e demarcou a fronteira do Brasil com o Peru.

Hoje, Manaus dista apenas 15 dias da Europa, achando-se a 1.000 milhas, rio acima. Em um artigo especialmente dedicado ao Amazonas, em outra parte deste volume, a extensão fluvial e outros assuntos foram considerados; mas o estado do Amazonas, sendo proeminentemente o Estado Fluvial ou melhor o Estado dos Rios, devemos aqui referir-nos outra vez às suas magníficas e poderosas correntes.

O estado é geralmente baixo e quase inteiramente produto do período terciário. O seu contorno irregular muito se aproxima do quadrado, estendendo-se por mais de 15 graus de longitude e mais de 15 graus de latitude. O Equador passa pela sua parte Norte, correndo o leito principal do Rio Amazonas numa latitude quase uniforme de 3 graus Sul; a maior parte do estado acha-se, pois, no Sul da zona tórrida.

 Entrada da cidade de Manaus
Foto publicada com o texto, página 974

Sobre o clima não há acordo entre os viajantes, quer brasileiros, quer estrangeiros. Fato é que, graças às conquistas da ciência, apresentando anualmente novos meios de defesa e submetendo a população a novos regimes de higiene, a vida no Amazonas, salvo em certos distritos notoriamente insalubres, não é mais perigosa do que na Índia Inglesa e em outras regiões; e no Congo ou na África Ocidental, a vida é infinitamente mais precária para a raça branca do que no Amazonas.

É uma terra em que a colheita é perpétua, em que a natureza não dorme nem descansa. É uma terra de poderosos rios, que são as suas únicas estradas, entre florestas que, se não fossem habitadas, se poderiam considerar virgens.

De Parintins, primeira povoação de importância no leito principal do rio, situada a 676 milhas a Oeste da cidade do Pará, até Tabatinga, onde o grande rio, vindo do Peru, penetra em território brasileiro, há 1.074 milhas de distância. Nesse enorme trajeto, três imensos rios entram no Amazonas, procedendo do Norte - o Içá, o Japurá e o Negro -, e cinco do Sul - o Javari, que é a linha divisória com o Peru, o Jutaí, o Juruá, o Purus e o Madeira.

Todos estes grandes rios têm ainda inúmeros afluentes; e há outros rios menores procedentes do Norte ou do Sul, que às dezenas desembocam na grande artéria amazônica e que são do volume do Tâmisa, o Sena ou o Tejo.

A par do explorador, do seringueiro e do negociante de madeiras, o geógrafo, muito especialmente, tem aqui vastíssimo campo de trabalho. O maior dos grandes rios que deságuam no Amazonas dentro dos limites do estado, é o mais oriental o Madeira, que, vindo das altas montanhas da Bolívia, tem um curso de 3.107 milhas.

De estranhar ou não, o estado do Amazonas, sendo bem conhecido dos comerciantes e viajantes, não o é igualmente do mundo científico e político; a constante ousadia desses indivíduos jamais foi utilizada, nem suas informações foram colecionadas e publicadas.

Tem-se calculado que os vapores percorrem mais de 3.100 milhas do sistema fluvial, e os navios de vela 3.400, mas, como este cálculo foi feito há muitos anos, é provável que tais números estejam muito abaixo das distâncias realmente percorridas.

A Alfândega
Foto publicada com o texto, página 975

Em outros artigos desta obra são estudadas a flora e a fauna do Amazonas; aqui não lhes faremos senão breves referências. Em todo o vasto estado, as margens do rio, revestidas de densas florestas, constituem o horizonte do viajante, e em nenhuma dessas florestas se poderia penetrar sem o auxílio do terçado e da machada.

As florestas do Amazonas têm sido chamadas "o desespero dos botânicos", apesar da dedicação de muitos e eminentes observadores brasileiros e europeus. Depois de apresentar uma lista bem minuciosa de orquídeas e palmeiras, conhecidos monarcas das plantas e árvores da Amazônia, diz o geógrafo francês Elisée Reclus: "Quanto às outras produções da floresta, preciosas madeiras, borracha, variadas gomas, resinas e substâncias canforadas, plantas medicinais, de tinturaria e fibras, o botânico as classificou em milhares de espécies, e a indústria está sempre aprendendo a conhecer os seus valores e aplicá-las".

Podemos citar o mesmo eminente autor com relação à fauna: "Reina um silêncio tumular em muitos pontos da floresta, donde se poderia inferir que a fauna é mal representada; entretanto, se não são muito numerosos os representantes de cada família, as espécies oferecem uma variedade singular".

Durante os seus onze anos de exploração no Amazonas, o naturalista Bates (a quem tanto deveu o ilustre Darwin) colecionou 14.712 espécies de animais, 8.000 dos quais eram completamente desconhecidos da ciência.

A vida nos recessos da floresta parece não existir; os lugares sombrios são pouco freqüentados, mas nos pontos banhados de luz pululam os insetos, as aves e os mamíferos. Nesta região onde as árvores e os répteis têm de lutar pela vida, os animais também procuram as zonas superiores em que há sol e vento.

Intendência Municipal, Manaus
Foto publicada com o texto, página 975

Entre os insetos (com efeito mais bem classificados do que os crocodilos, os tapires, os jaguares e outras muitas famílias da fauna) são tão abundantes que chegam a constituir grave perigo. Assim, os mosquitos de noite e os piuns de dia tornam certos lugares às margens do Purus absolutamente inabitáveis; mais de um milhão voam em um metro cúbico de ar; muita gente sofre de abscessos produzidos pelas suas mordeduras e alguns ficam mesmo paralíticos.

As saúvas, formigas tão conhecidas dos naturalistas pelos trilhos que fazem de folhas cortadas, que armazenam em suas furnas subterrâneas, impossibilitam a lavoura em certos lugares; as plantações de café, que são tão dispendiosas, têm sido destruídas pela invasão deste inseto. A saúva, que pode se estender em uma linha de 50 a 65 jardas de comprimento, emprega um exército de mineiros supridos de um olho na testa como os cíclopes da fábula. Uma serpente vermicida, a amfisbena, que os nacionais acreditam ter duas cabeças e cuja mordedura consideram venenosa (crenças errôneas), vive sob as galerias destas formigas. Por outro lado, várias tribos de índios colhem formigas que misturam aos milhões com a sua farinha de mandioca.

Assistindo a um embarque
Foto publicada com o texto, página 976

Como dissemos, a população deste vasto território é avaliada em 400.000 almas, entre as quais figuram 150.000 índios. Esta avaliação dos habitantes indígenas é contudo pura suposição. Pode ser o dobro ou a metade, tão impossível tem sido até hoje, à vista do nosso deficiente conhecimento do estado, fazer um cálculo seguro.

Orellana, que primeiro desceu o Amazonas com 50 companheiros, fez referência no seu relatório a grande número de vilas nas margens deste rio. Três séculos depois, 150 tribos distintas que povoavam essas vilas desapareceram. A invasão dos brancos sem dúvida concorreu muito para diminuir a população indígena e é muito raro encontrarem-se índios de pura raça nas margens dos rios. À maioria desses indígenas, tem sido dado o nome genérico de tapuios, e a sua linguagem, embora menos pura, está se misturando com a dos guaranis que habitam a extremidade Sul do Brasil.

Como os índios do Brasil são descritos em outra parte desta obra, não podemos senão dar os nomes das tribos que têm representantes no estado do Amazonas. Tais são as suas divisões principais - os tapuios, os maranhas e os altis; subdivididas em mura, zuma, manaos, macu, tariana, catanixi, paumari, maiorunas, passé, ticunas, zahuas, os panos e outras.

Entre estas, há ainda algumas tribos belicosas que evitam a presença dos mestiços e brancos e atacam em ocasiões oportunas os exploradores que acaso se perdem nessas regiões.

Contudo, os índios meio civilizados, tristemente resignados com a proximidade dos brancos armados, são provavelmente em maior número; pois com o cruzamento das raças e com o correr dos tempos, a quantidade de índios brancos e pretos decerto excedeu grandemente os índios de puro sangue.

O palácio do governo
Foto publicada com o texto, página 976

O corpo operário do Amazonas tem sido suprido de mestiços e especialmente de cearenses, estes de cruzamento português, indígena e africano. A história do suprimento de operários ao Amazonas e ao Pará, pelo Ceará, é uma curiosa página da história pátria. Apesar de ser necessariamente tratada no trabalho relativo ao estado do Ceará, deve aqui merecer uma breve notícia.

Assim como no Pará, também no Amazonas se verifica que uma proporção apreciável de seringueiros procede, não do estrangeiro, mas sim daquele estado brasileiro, muito menor, porém muito mais populoso. Trabalhando como o italiano em S. Paulo, ou o alemão no Rio Grande do Sul, os cearenses têm sido induzidos aos milhares a enfrentar as florestas virgens e a solidão do Amazonas, e a passar anos e anos de pobreza e duro labor no cultivo da seringueira, regressando às vezes relativamente ricos para o seu estado natal, quase nunca resolvidos a voltar.

Mas, a despeito do grande número de mestiços e cearenses que há no Amazonas, os operários são ainda poucos, e a escassez da população continua a ser o motivo principal do pequeno e moroso desenvolvimento do grande território. Nem é mesmo um ideal a vida do operário nos seringais do Amazonas. Quando se acha na sua estrada, em algum recesso longínquo da floresta, distante talvez alguns milhares de milhas de Manaus, via fluvial, ele se vê verdadeiramente isolado.

A estrada pode ter de 100 a 150 seringueiras. Para elas se volta todo o seu cuidado, e o seu trabalho é duplo: primeiro a colheita da seiva, depois o seu preparo. Quando as inundações do inverno tornam inabitável a floresta, o paroara, como é denominado, retira-se para o centro do vasto campo, de que tem sido sentinela avançada, e, esperando a baixa das águas, goza do único repouso da sua dura existência.

É aqui que mais facilmente podem ser conhecidos os paroaras, entre os quais a avareza e a ambição na procura da borracha são tão fortes como a sede do ouro em outra qualquer parte do mundo. Dir-se-ia que desaparecem neles os outros desejos, todos os outros sentimentos; desprezam o conforto e até a saúde; o dinheiro que lhes é dado pela bela seringueira, dissipam-no freqüentemente em orgias.

Eis o que diz um observador francês: "Apesar das fadigas e perigos, poucos paroaras atualmente se tornam independentes com o fruto dos seus labores; a sua condição é quase sempre miserável; as despesas de viagem ao lugar do trabalho, feitas pelo proprietário do seringal, são lançadas a débito do operário. Assim começa a sua vida com uma dívida regularmente pesada, não podendo ele readquirir a sua liberdade enquanto não for liquidada. Ao mesmo tempo lhe é lançado em conta tudo que consome, fornecido pelo administrador a preços arbitrários: gêneros, vestuário e outros artigos, desde a farinha de mandioca até os instrumentos de trabalho. As dívidas dos paroaras fazem-nos verdadeiros escravos; a fuga lhes é difícil, acham-se nas garras dos patrões, bons ou maus, e para eles não há apelo. Numa região como o Amazonas, a ação da polícia é quase nula".

Embora, porém, represente a borracha para o Amazonas o que para a Argentina representa a criação do gado, não é esse produto o único deste ubérrimo estado. Fala bem alto a seguinte lista de outras exportações: peixe salgado, madeiras, tabaco, peles preciosas, couros, cacau, óleo de copaíba, piaçaba, cereais, gado suíno, peles de carneiro, conchas e plumas. Entre os estados exportadores, vem o Amazonas logo depois de S. Paulo e Rio de Janeiro. Em 1908 exportou só de borracha 18.065.105 quilos, no valor de £5.968.761.

Só Manaus, capital do estado, merece o nome de grande cidade, mas há cerca de vinte outras, além de vilas consideráveis espalhadas pelo estado. As principais são: Lábrea, Tefé, Borba, Humaitá, Manicoré, Maués, Olivença, Antimari, Caquetá, Vila Bela, Silves, Serpa e Rio Branco.

Vistas de Manaus: 1) Sociedade Portuguesa de Beneficência; 2) Automóveis da cidade; 3) O porto; 4) A catedral; 5) Uma praça pública - Foto publicada com o texto, página 977

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