Após cassação, Eduardo Cunha está inelegível até janeiro de 2027
O ex-presidente da Câmara sofre uma derrota acachapante no plenário da Câmara e tem o mandato cassado por 450 votos. Apenas 10 aliados se mostraram fiéis e se posicionaram contra a perda do mandato. Peemedebista culpa o impeachment de Dilma pelo resultado adverso
Paulo de Tarso Lyra /Correio Braziliense , Julia Chaib - Ed Alves/CB/DA Press
Quase cinco meses após conseguir aprovar o processo de impeachment de Dilma Rousseff na condição de todo-poderoso presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) sofreu às 23h50 de ontem a maior derrota da sua trajetória política: acabou cassado por 450 votos a favor e apenas 10 contrários, com nove abstenções. Acusado de ter mentido à CPI da Petrobras ao dizer que não tinha conta no exterior e alvo de um processo por quebra de decoro parlamentar que durou pouco mais de 10 meses, o mais longo da história do Conselho de Ética, Cunha acompanhou a votação em plenário e saiu atirando contra o Planalto. “Eu culpo o governo, que se aliou ao PT, para eleger um presidente da Câmara (Rodrigo Maia, do DEM-RJ) com uma única missão: cassar o meu mandato”, acusou Cunha.
O agora ex-deputado, que está inelegível até 2027, prometeu escrever um livro contanto todos os bastidores do impeachment de Dilma Rousseff, incluindo conversas com diversos agentes públicos e políticos. Negou que vá fazer delação premiada, como tem sido ventilado, há tempos, por aliados. “Só faz delação quem é criminoso e eu não cometi crime nenhum.” Cunha citou nominalmente o secretário do Programa de Parceria de Investimentos (PPI), Moreira Franco, como um dos seus desafetos. “Ele é sogro de Rodrigo Maia”, lembrou. Questionado se era uma ameaça ao Planalto, o peemedebista foi lacônico. “Eu não sou homem de fazer ameaças veladas”, pontuou. Rodrigo Maia não participou da votação, conforme previsto no Artigo 17 do Regimento Interno da Câmara.
Cunha disse ter sido alvo de vingança do PT e reclamou, também, do fato de a votação de ter sido marcada para ontem. “Diziam que estavam me protegendo por ter marcado a sessão para depois da conclusão do processo de impeachment de Dilma. Mas ela aconteceu em uma semana solta, a 15 dias das eleições. Com um plenário onde temos 50 candidatos a prefeito e outros tantos apoiando amigos e familiares, o resultado não poderia ser outro”, afirmou.
O peemedebista também ironizou a decisão de Rodrigo Maia de não ter aceitado o requerimento apresentado pelo deputado Carlos Marun (PMDB-MS), que deixava uma brecha para um abrandamento da pena. “Curiosamente, o Senado fatiou o impeachment da ex-presidente Dilma com base em um artigo da Câmara. E Maia, que preside a Casa, recusou-se a aceitar o pedido”. Duas questões de ordem foram apresentadas.
Conforme já havia sido combinado, Marun pediu a votação um projeto de resolução, que, passível de emendas, permitiria a sugestão de uma pena mais branda a Cunha, como a suspensão do mandato. Maia recusou a questão e Marun entrou com recurso pedindo efeito suspensivo, que poderia retardar ainda mais o processo, mas não teve o apoio de nem um terço do plenário para colocar a proposta em análise.
Tese do “golpe”
Em discurso de defesa aos parlamentares, antes de ser cassado, Cunha negou ter mentido à CPI da Petrobras e afirmou que não tem contas no exterior. “Cadê a conta? Qual o número da conta?”, questionou. Ao longo de seu discurso, que superou os 25 minutos previstos, o peemedebista buscou reforçar que a cassação alimentaria a tese de “golpe” defendida pelos apoiadores de Dilma.
Ele garante não se arrepender de ter aceito o pedido de impeachment da ex-presidente. “Eu me arrependo de não ter aceitado antes.” Cunha disse ainda não temer o juiz Sérgio Moro, que conduz o inquérito da Lava-Jato em Curitiba. Com a cassação, o peemedebista perde o foro privilegiado e o processo deve deixar de ser analisado pelo Supremo Tribunal Federal. “Eu vou continuar me defendendo, só que, agora, em outra instância. Mas eu não temo pela minha família nem temo ser preso. Eu só temo a Deus.”
O resultado dilatado surpreendeu até mesmo o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Rodrigues (PR-BA). “Dez? Só 10 mesmo? Tem certeza que é só isso?”, indagou o parlamentar, atônito, a um assessor ao lado dele. Um voto a mais do que Cunha obteve no colegiado presidido por Araújo.
Cunha, que se manteve o tempo todo no plenário ouvindo os ataques e críticas dirigidos a ele, deixou o recinto tão logo o resultado foi proclamado, para conversar com os jornalistas. No caminho até um púlpito montado no Salão Verde — no mesmo local em que, em 2 de dezembro de 2015, anunciou que aceitara o pedido de impeachment contra Dilma Rousseff —, ouviu xingamentos de um grupo de servidores, que cantaram “na Terra do Senhor, não existe Satanás”.
O deputado Sílvio Costa (PTdoB-PE) elogiou a coragem de Cunha e de Carlos Marun, praticamente a única voz que se levantou em plenário contra a cassação. “Eu voto pela sua cassação, deputado Cunha, porque era oposição ao senhor nos tempos em que era voz isolada aqui. Mas o senhor e o deputado Carlos Marun são coerentes. Estão do lado errado, mas não são como o PSDB, o DEM e o PMDB, que lhe abandonaram”. Costa acabou vaiado por deputados tucanos.
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