Acuse-os daquilo que você faz - Por Miriam Macedo
Era 77/78 (por aí). Eu tinha 24/25 anos, era repórter política no Congresso, em Brasília. Apareceu por lá um jornalista, homem mais velho, chamado Adauto. Era afável, educado e discreto. Uma pessoa boa. Apresentou-se como repórter-correspondente de um jornal de que não me lembro o nome. Não era nenhum veículo de comunicação da chamada 'grande imprensa'..
Foi, então, que começou a correr um boato de que ele seria 'cana' (informante da polícia). Dizia-se que ele teria feito parte de uma organização de esquerda e que, preso, concordou em dar depoimento à televisão renegando a luta armada e o socialismo. Ninguém nunca viu o depoimento. Adauto teria sido mandado trabalhar entre repórteres para dedurá-los.
As "evidências' de sua condição de 'dedo-duro' era o interesse em saber o que um ou outro de nós escrevia e o pedido para tirar cópia de algumas matéria para que ele também pudesse noticiá-la. Nada muito mais que isto.
Mas o boato criou força. E decidiu-se que ele deveria ser expulso do Comitê de Imprensa da Câmara. Marcou-se o dia, apresentaram-se as "evidências", fêz-se a votação, (acho que) sem direito de defesa do acusado - o que ele poderia fazer, negar? - e expulsamos Adauto do Comitê de Imprensa da Câmara "porque ele era dedo-duro".
Fizemos isto SEM PROVAS! A maioria esmagadora dos repórteres credenciados era de jovens. Todos de esquerda. Eu era um das mais entusiasmadas pela expulsão. Cunhamos até um refrão: "Adauto vovô, o dedo-duro cocô". (Pura canalhice e ignomínia).
Os mais velhos, alguns, tentaram alertar para a arbitrariedade, foram ignorados. Outros preferiram não se comprometer. Lembro que, depois de expulso, Adauto conseguiu permissão de Marco Maciel (ele mesmo) para escrever suas matérias no gabinete da Presidência da Câmara (que Maciel ocupava na época).
A ironia é que, em 73, quando fui presa pelo DOI-CODI, eu amarelei e, sem ter sofrido nenhuma das torturas que sai mentirosamente contando, dei com a língua nos dentes e entreguei tudo e todo mundo. Não sabia nem tinha feito muita coisa, mas não era também nenhuma sacristã. Eu pertencia a uma célula da AP-ML, a ala vermelha do PC do B, linha maoísta, que fazia a guerrilha no Araguaia (aquela de José Genoíno). Este grupo lutava mesmo era pela implantação de uma ditadura comunista nos moldes chineses, ainda que arrotássemos as palavras de ordem da 'luta pelas liberdades democráticas". Mentira pura.
Jovem é isto. Foi assim que eu agi quando era jovem e dizia viver "uma época de rebeldia, de independência, de amor à liberdade".* Fui canalha e não posso alegar nada em meu favor. Eu sabia àquela época que o que estávamos fazendo era um ato fascista. Este episódio pesou tanto na minha consciência que fiz uma confissão com um padre só para pedir perdão a Deus por este pecado.
Era 77/78 (por aí). Eu tinha 24/25 anos, era repórter política no Congresso, em Brasília. Apareceu por lá um jornalista, homem mais velho, chamado Adauto. Era afável, educado e discreto. Uma pessoa boa. Apresentou-se como repórter-correspondente de um jornal de que não me lembro o nome. Não era nenhum veículo de comunicação da chamada 'grande imprensa'..
Foi, então, que começou a correr um boato de que ele seria 'cana' (informante da polícia). Dizia-se que ele teria feito parte de uma organização de esquerda e que, preso, concordou em dar depoimento à televisão renegando a luta armada e o socialismo. Ninguém nunca viu o depoimento. Adauto teria sido mandado trabalhar entre repórteres para dedurá-los.
As "evidências' de sua condição de 'dedo-duro' era o interesse em saber o que um ou outro de nós escrevia e o pedido para tirar cópia de algumas matéria para que ele também pudesse noticiá-la. Nada muito mais que isto.
Mas o boato criou força. E decidiu-se que ele deveria ser expulso do Comitê de Imprensa da Câmara. Marcou-se o dia, apresentaram-se as "evidências", fêz-se a votação, (acho que) sem direito de defesa do acusado - o que ele poderia fazer, negar? - e expulsamos Adauto do Comitê de Imprensa da Câmara "porque ele era dedo-duro".
Fizemos isto SEM PROVAS! A maioria esmagadora dos repórteres credenciados era de jovens. Todos de esquerda. Eu era um das mais entusiasmadas pela expulsão. Cunhamos até um refrão: "Adauto vovô, o dedo-duro cocô". (Pura canalhice e ignomínia).
Os mais velhos, alguns, tentaram alertar para a arbitrariedade, foram ignorados. Outros preferiram não se comprometer. Lembro que, depois de expulso, Adauto conseguiu permissão de Marco Maciel (ele mesmo) para escrever suas matérias no gabinete da Presidência da Câmara (que Maciel ocupava na época).
A ironia é que, em 73, quando fui presa pelo DOI-CODI, eu amarelei e, sem ter sofrido nenhuma das torturas que sai mentirosamente contando, dei com a língua nos dentes e entreguei tudo e todo mundo. Não sabia nem tinha feito muita coisa, mas não era também nenhuma sacristã. Eu pertencia a uma célula da AP-ML, a ala vermelha do PC do B, linha maoísta, que fazia a guerrilha no Araguaia (aquela de José Genoíno). Este grupo lutava mesmo era pela implantação de uma ditadura comunista nos moldes chineses, ainda que arrotássemos as palavras de ordem da 'luta pelas liberdades democráticas". Mentira pura.
Jovem é isto. Foi assim que eu agi quando era jovem e dizia viver "uma época de rebeldia, de independência, de amor à liberdade".* Fui canalha e não posso alegar nada em meu favor. Eu sabia àquela época que o que estávamos fazendo era um ato fascista. Este episódio pesou tanto na minha consciência que fiz uma confissão com um padre só para pedir perdão a Deus por este pecado.
Nota: Na parte II emitirei uma opinião
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