6 de abr. de 2019

Maduro utiliza grupos armados para reprimir a população


Os coletivos paramilitares desestabilizam os protestos e violam os direitos humanos, com o respaldo do governo madurista.
AMEAÇAS TRANSNACIONAIS Membros mascarados dos coletivos – grupos comunitários 
irregulares sustentados pelo governo – chegam a um protesto em Caracas para intimidar os cidadãos, 
no dia 7 de janeiro de 2019. (Foto: Yuri Cortez, AFP)
Dialogo-Amerias - Gustavo Arias Retana - Além da contínua crise humanitária, social e política da Venezuela, um apagão de vários dias deixou o país sem energia elétrica em casas e hospitais, causou a suspensão do abastecimento de água e paralisou o sistema de transporte público. Além disso, no dia 12 de março de 2019, Nicolás Maduro incitou a violência entre seus seguidores. “Convoco os coletivos, a todos; chegou a hora da resistência ativa”, disse.

A mensagem, transmitida em cadeia nacional, foi dirigida aos coletivos, um dos maiores respaldos do governo de Maduro para manter-se no poder. O Estado arma os grupos paramilitares de forma indireta para desestabilizar as manifestações antigovernistas com intimidações e repressões violentas, o que as forças de segurança oficiais não fazem para evitar processos legais.

As organizações comunitárias irregulares remontam ao início do regime de Hugo Chávez (1999-2013) e, em muitos casos, controlam bairros inteiros, sobretudo na capital, Caracas. Elas controlam a distribuição de alimentos a “preços oficiais” e são vinculadas a negócios ilícitos, como o tráfico de drogas e as extorsões.

Os coletivos se movimentam em grupos de cerca de 20 pessoas, em motocicletas e veículos de tipo militar sem identificação. Nos confrontos contra a população, seus membros se reconhecem entre si com cores diferenciadas. Contam com armamento de vários tipos, desde pistolas até fuzis de uso exclusivo da Força Armada.

Para José Ricardo Thomas, cientista político da Universidade Central da Venezuela, os grupos são o principal apoio que restou a Maduro, para evitar que a população termine de se levantar contra a sua ditadura. “As bases dos coletivos são marginais, criminosos, presidiários e políticos de baixo nível”, explicou Thomas à Diálogo. “Muitos são membros ativos da Força Armada e da polícia que, ao retirar o seu uniforme, colaboram com os criminosos que integram seus grupos. Sua função é amedrontar, fustigar, saquear e assassinar, a fim de aniquilar os protestos contra Maduro, pois o que o regime mais teme é o levante da população”, acrescentou.

“Esses grupos [são] violentos; utilizam a violência tanto simbólica quanto física”, disse à Diálogo Rafael Uzcátegui, coordenador da PROVEA, uma ONG venezuelana defensora dos direitos humanos. “Seu modus operandi é a intimidação.”

Os paramilitares utilizam diferentes níveis de violência; às vezes apenas a sua presença no espaço público já constitui um problema. “Vinte motociclistas percorrendo a rua já espalham temor suficiente para que as pessoas não se unam aos protestos. É um tipo de violência simbólica importante”, reiterou Uzcátegui. “Quando é necessário, eles apelam para a violência física; usam armas de fogo e [efetuam] invasões, golpeiam e ameaçam as pessoas. Suas participações são claras violações dos direitos humanos com a permissão dos funcionários estatais e de Maduro.”

Coletivos governistas interromperam uma manifestação
no Tribunal Supremo de Justiça, em Caracas, em junho de 2017,
 feita com o objetivo de bloquear uma
 nova constituição que outorga poderes
 plenipotenciários irrevogáveis
 ao governo. (Foto: José Cohen, AFP)
Outra função dos coletivos é controlar os bairros populares, que são zonas vitais para o manifesto de Maduro. “Eles controlam territórios que têm um valor simbólico importante para o governo, sobretudo as zonas populares”, disse Uzcátegui. “Maduro pode tolerar os protestos nas regiões de classe média, porque lhe ajudam a fortalecer o seu discurso de que são os grupos privilegiados os que estão descontentes com sua administração. O que ele não consegue tolerar são os protestos nas zonas mais desassistidas porque, segundo os seus argumentos, ele [o seu regime] ajuda os pobres e os pobres deveriam ser gratos. É aí que os coletivos atuam para amedrontar a população, para manter o controle, espalhando o medo entre as classes mais pobres.”

Ambos os especialistas acreditam que o governo de Maduro utiliza cada vez mais os coletivos para evitar o comprometimento dos funcionários oficiais nas práticas violentas contra a população. Eles praticam ações à margem da lei, que o governo quer que fiquem impunes.

Cinco mortes recentes foram atribuídas a esses grupos no dia 23 de fevereiro de 2019, nas fronteiras com a Colômbia e o Brasil, quando nações parceiras tentaram entrar na Venezuela com ajuda humanitária. Os manifestantes foram recebidos a tiros, atos que teriam sido efetuados pelos membros dos coletivos. 

Procedência das armas

O equipamento dos grupos comunitários está ligado ao desvio de recursos do Estado. Thomas explica que inicialmente eles possuíam armas de 9 milímetros, que eram de uso comum nas instituições policiais, mas, desde 2004, eles têm em seu poder armas desincorporadas do Exército e, a partir de 2014, começou a ser identificado o porte de fuzis de origem russa de maior calibre, como os Kaláshnikov.

Outro método usado pelo Estado para armar os coletivos é lhes dar passe livre para realizarem negócios ilícitos, como a extorsão ou o tráfico de drogas. Talvez a administração de Maduro não esteja entregando o armamento de maneira direta, mas ela lhes facilita a prática de atividades fora da lei, com as quais eles obtêm os recursos para adquirir as armas. “Como eles controlam as zonas, controlam diferentes tipos de negócios, como as vendas de alimentos. Eles transportam drogas e há confrontos entre eles para controlar determinados territórios, em função dos lucros que eles geram”, garantiu Uzcátegui.

Os coletivos são um método a mais de repressão, entre tantos outros, que Maduro utiliza para se agarrar ao poder. Enquanto isso, ele perde terreno e a população já não se pergunta se poderá se libertar da opressão governista, mas sim quanto tempo ainda falta para que ele balance e caia, o que lhes permitirá a todos respirar liberdade.

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