11 de nov. de 2010

UM HECTARE, 30 ANIMAIS E 60 NOITES RENDEM OITO TONELADAS DE ESTERCO SECO

Utilizando esse sistema, agricultores familiares podem colher em média 20 t de raiz de mandioca ou 1,5 t de milho ou 2 t de arroz ou 800 kg de feijão caupi por hectare, apenas com a fertilização do solo com esterco de curral /MONTEZUMA CRUZ

RAIMUNDO BRABO ALVES
e ALFREDO HOMMA

BELÉM, Pará – No Estado do Pará, muitos agricultores já utilizaram no passado o método da parcagem na fertilização de solos, principalmente na produção de fumo na Zona Bragantina (Penteado, 1967). Nessa região o método se iniciava em janeiro, quando o gado era trazido todas as tardes para os currais móveis onde eram feitos os plantios.

O gado permanecia preso até o mês de maio e em junho ocorria a “viração da terra”. O tempo gasto para revolver uma tarefa estrumada variava de acordo com o tipo de solo e principalmente, com o uso ou não do arado. Em média uma tarefa revolvida com auxílio de arado atrelado a dois animais, correspondia a uma diária de dois trabalhadores. Com o auxílio de enxadas eram necessários 15 a 20 homens para um dia de trabalho (Silveira, 1979).

O sistema consiste basicamente na aplicação localizada de esterco de gado, onde um grande número de animais é confinado durante a noite numa área reduzida.

Silva (1980) relata boas respostas a aplicação de seis a 15 toneladas de esterco de gado para produção de mandioca no Rio Grande do Norte, porém níveis mais elevados reduzem os rendimentos.

Na Bahia, Gomes et al. (1983) obteve altos rendimentos com a cultura (38,6 t de raízes/ha), utilizando o sistema de parcagem. Ele calculou que 30 animais confinados em uma área de um hectare por 60 noites, produzem cerca de oito toneladas de esterco seco, contendo 40 kg de nitrogênio por hectare.

Quase seis milhões de toneladas

Segundo Costa (1986), a produção de esterco fresco de gado por cabeça pode ser calculada na quantidade de 32 kg/dia. O mesmo autor indica os teores médios de 0,23% de P2O5 encontrados na composição do esterco fresco. No Amapá, os pequenos produtores da região dos Lagos no sudeste do Estado, também utilizavam o método da parcagem para produção de fumo.

A mesorregião Sudeste Paraense possui um rebanho bovino de 8,2 milhões de cabeças (IBGE, 2002). Mantida a mesma proporção do Censo Agropecuário de 1996 em que as propriedades com menos de cem hectares detinham 16% do rebanho (IBGE,1996), estima-se um rebanho de 1,3 milhão de bovinos nas pequenas propriedades familiares do Sudeste Paraense. Isto equivale à produção diária de 5,7 milhões de toneladas de esterco. Esta produção tem potencial para fertilizar 21 mil ha a cada 60 dias.

Já usada por movimentos sociais e pequenos agricultores, a parcagem complementa a pecuária na viabilização econômica de pequenas propriedades familiares do sul e sudeste do Pará /SITIO SANTA MARIA

Europa pode enviar para Amazônia
500 mil toneladas por ano

Considerando a possibilidade de utilização de um ciclo de 180 dias para a aplicação do método de parcagem na região, essa área fertilizada se multiplicaria para 129 mil ha para produção de alimentos. É interessante mencionar que na Inglaterra, França, Alemanha, Holanda, entre outros, a destinação dos dejetos animais constitui um grande problema ecológico.

Daí, a proposta do governo holandês em fornecer para a Amazônia 500 mil toneladas de esterco de suínos e aves por ano para promover a recuperação de áreas degradadas e com isso reduzir os desmatamentos e queimadas (Marajó, 1995).

Com base nesse potencial e considerando a agroecologia atividade perfeitamente adequada para a integração agricultura/pecuária, de modo a promover a elevação da rentabilidade das pequenas propriedades familiares em bases auto-sustentáveis, decidiu-se por descrever esse método milenar de fertilização do solo.

Descrição do Método

Escolha a melhor área para plantio na propriedade, isto é, a mais plana de modo a evitar a lavagem do esterco pela enxurrada, de solo bem drenado e sem ocorrência de pedras ou tocos. Alguns meses antes da época de plantio, prepare uma cerca provisória para a contenção de 30 animais adultos somente para pernoite. Esta cerca pode ter a dimensão de 50 m X 50 m, que define uma área equivalente a ¼ de hectare (figura 1). Pode ser feita de varas retiradas na propriedade (caiçara), de arame liso ou se o produtor dispuser de mais recursos, pode ser uma cerca elétrica.

Rotação nos piquetes para o preparo de 1 hectare no sistema de parcagem

Contenha 30 reses no piquete nº 1, por um período de 15 noites. Transferir a cerca para definir o segundo piquete. Depois, desloque os animais para o piquete nº 2, mantendo-os por mais 15 pernoites. Posteriormente repita o mesmo procedimento nos piquetes de nº 3 e nº 4. Ao final do quarto rodízio, teremos adubado um hectare.

Pode-se colocar em cada piquete um ou dois cochos com sal mineral, como complemento alimentar dos animais. O final desse processo deve coincidir com o início da época de plantio. O próximo passo é a incorporação do esterco que pode ser feito com uma grade aradora (meia hora/trator/ha), ou com arado de aiveca tracionado por dois animais (2 dias/h/ha) ou com a própria enxada (de 15 a 20 dias/h/ha). Após essa operação, plante mandioca, milho, arroz ou feijão.

Utilizando esse sistema, os pequenos agricultores familiares que dispõem de um pequeno rebanho bovino podem colher em média 20 t de raiz de mandioca ou 1,5 t de milho ou 2 t de arroz ou 800 kg de feijão caupi por ha, apenas com a fertilização do solo com esterco de curral.

Mesmo em períodos secos a concentração do rebanho bovino durante a noite em espaços determinados ou mediante o estabelecimento de capineiras poder-se-ia utilizar essas áreas para o plantio de culturas anuais no início das chuvas, ou mediante uso da irrigação, ou para a recuperação das próprias pastagens.


Alguns cuidados devem ser observados quando da aplicação do método. Precuaução com a aplicação de esterco de gado que pasta na forragem em que ocorre controle de invasora com herbicida, que pode estar ativo, dependendo da concentração de agrotóxico no esterco. Não efetuar o método no período chuvoso para evitar a formação de atoleiros, apodrecimento do casco dos animais, verminoses e outros.

A quantidade de estrume que pode ser aplicada por ha depende do tipo de solo e deve ter por limite não mais do que o equivalente a 150 kg de N por hectare. Os impactos ambientais positivos podem ser relacionados, como a produção de biofertilizante, a redução da emissão de amônia, a redução da emissão de gás metano, o melhoramento da fertilidade do solo, o potencial produção de biogás e a comercialização de produtos orgânicos de alto valor agregado. Os impactos negativos são o odor desagradável, devido à concentração de animais, o risco de poluição da água e o aumento da população de insetos.



Incorporado o esterco com grade aradora. arado de aiveca tracionado por animais, ou mesmo com a própria enxada, pode se plantar em seguida mandioca, milho, arroz e feijão /SITIO SANTA MARIA

Conclusões

As precárias condições socioeconômicas e ambientais da maioria dos assentamentos da reforma agrária no Sul e Sudeste Paraense é conseqüência do modelo de uso da terra, respaldado na pecuária com baixos índices de produtividade e como atividade exclusiva.

O desconhecimento e as limitadas condições de acesso a informação leva os pequenos produtores a não manejar nem os recursos naturais que lhes são disponíveis, como é o caso do esterco de curral. A alternativa de curto prazo é a diversificação da propriedade com a integração agricultura/pecuária.

Como ponto de partida pode-se sugerir a introdução do método da parcagem para exploração das culturas de mandioca, milho, arroz e feijão, inicialmente como subsistência e, posteriormente, como geradora de excedente para o mercado.

(*) Pesquisadores da Embrapa Amazônia Oriental. Nomes entre parêntesis correspondem à citação de outros pesquisadores


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