15 de mar. de 2019

Dá Série: Meus Heróis não morreram de overdose - P-47 depenado!


27/janeiro/1945/ Casarsa, nordeste da Itália, a 410 km de Pisa

Mais um dia gelado e de céu azul. 

A cinco mil pés, os P-47 da FAB oscilam suavemente ao ritmo das turbulências, com as hélices desenhando círculos amarelados.

Em voo, os pilotos não conseguem discernir se o sol esquenta ou esfria ainda mais a cabine e a intensa claridade obriga-os ao uso constante de óculos com lentes escuras.

A Esquadrilha Amarela está empenhada naquilo que os Jambocks mais gostam de fazer: atacar alvos de oportunidade.
Voando em pares, os P-47 se protegem mutuamente e atiram em tudo o que se mexe sobre rodas. O Tenente Dornelles, no P-47 nº 2, voa um pouco à frente e acima do P-47 código A6 do Tenente Canário, olhos atentos varrendo as colinas e vales cobertos de neve.

Súbito uma voz grita no rádio “- veículo às 4 horas, saindo rápido”. Um semi track de 8 ton. Sd.Kfz, provavelmente flakvierling, pois está coberto com encerado. Se for mesmo, é preciso agir rápido. Dornelles manda o A6 pra cima dele e o Thunderbolt quebra imediatamente, mostrando seu volumoso ventre cinza claro.

Canário não perde tempo e atira uma primeira salva, cujas balas se perdem numa colina próxima. Dornelles, por sua vez, atira, mas o caminhão derrapa numa curva e consegue escapar. De novo, Canário em posição e ainda mais baixo, atira uma longa salva atingindo em cheio o veículo que estoura como uma granada, numa explosão seca e repleta de estilhaços.

Fascinado pelo espetáculo e sem perceber, o P-47 voa ao encontro de uma chaminé. No último instante Canário enxerga o obstáculo e gira desesperado, tentando tirar a asa do caminho, mas é tarde demais. No cockipt, o piloto não sente um impacto violento. A coisa pode ser explicada como uma chicotada que reverbera pelo manche, sentida em sua mão enluvada. Devido à formidável inércia e massa, o avião derruba a construção em meio a uma nuvem de fumaça, tijolos e pedaços de alumínio da asa, saindo do outro lado em voo reto e nivelado.

Estupefato, Canário observa que onde deveria existir estrutura do avião, agora enxerga o solo deslizando lá embaixo. Falta-lhe quase um metro e meio de asa!

Dornelles emparelha ao seu lado e, de queixo caído, vê cabos, tiras das cintas de balas balançando e pedaços de metal escapando. Mas o Thunderbolt, incrivelmente, continua voando!

Crispado nos comandos do danificado avião, Canário luta para manter o equilíbrio, enquanto Dornelles imagina o melhor rumo para o retorno. “- Vamos pelo Adriático” grita o Tenente.
O P-47 vibra, oscila, mas se mantem nivelado apesar de tudo. Os dois aviões sobrevoam Veneza e seguem para o sul, evitando uma área de proteção antiaérea.

O voo prossegue relativamente bem, até nas imediações de Chioggia, quando, então, as coisas se complicam. Dois caças cruzam e atacam os aviões brasileiros. Impossibilitado de fazer qualquer manobra brusca, Canário permanece no seu nível de voo, enquanto Dornelles faz frente aos atacantes mostrando os dentes. Mas que merda é essa? Os atacantes são Spitfires da RAF! Ao perceberem o equívoco, os ingleses balançam as asas em saudação e afastam-se em direção ao continente. Caramba, passado o susto, Dornelles volta à posição de fiel escudeiro prosseguindo em formação.

Já próximo à Pisa, o tempo aberto no início da manhã deu lugar a uma cobertura 3/8, dificultando a visualização de solo. Diante isso, Dornelles ordena ao Canário para manter-se em altitude, enquanto ele desce e pede auxílio e instruções à torre. Contudo, esgotado e pressionado pelo longo e angustioso voo, Canário se precipita e desce juntamente com o líder, que orienta o A6 para uma aproximação reta.

Quando tudo parecia que ia dar certo, a torre dá contra-ordem para afastarem-se e fazer mais um circuito. Um P-61 Black Widow americano, ainda em piores condições, estava com prioridade.

Irritado, Canário imagina o que poderia ser mais prioritário do que um P-47 sem asa!

Mas, não teve jeito. Fazendo curvas quadradas e tensas, se arriscando à eminente perda de sustentação, Canário executa mais um circuito e, finalmente, coloca as rodas do depenado Thunderbolt no chão.

Seu P-47 não o abandonara.

              Fonte: Contos do Céu/ Facebook
OBS: Esse P-47 encontra-se preservado no MUSAL (Museu Aeroespacial no Rio de Janeiro), com a designação D5.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Atenção:
Comentários ofensivos a mim ou qualquer outra pessoa não serão aceitos.