26 de set. de 2011

INFECÇÃO HOSPITALAR NO BRASIL MATA MAIS DO QUE GUERRA DO VIETNÃ

Nos últimos dias, a Saúde ganhou espaço na imprensa com um noticiário emblemático da grave crise do setor. No Rio de Janeiro, a espantosa e inaceitável via crucis de um acidentado por cinco unidades da rede pública encerrou todos os elementos dessa dramática, desumana situação.

No episódio juntaram-se exemplos do desaparelhamento de hospitais e clínicas, da necessidade de melhorar o gerenciamento dos órgãos, da leniência do poder público e do desapreço de maus profissionais pela situação de pacientes (no caso, um rapaz que, com politraumatismo, saiu de Duque de Caxias e só conseguiu ser internado depois de um calvário de sete horas e 80 quilômetros, ouvindo recusas).

Na capital fluminense, deu-se também outro exemplo do caos, com o fechamento do centro cirúrgico do Hospital Pedro Ernesto, onde moscas invadiram um espaço por definição asséptico.

Vistos isoladamente, esses casos poderiam ser atribuídos apenas a ineficiências do sistema fluminense. Mas a semana virou com a revelação de outros malfeitos. A Polícia Federal investiga irregularidades (superfaturamento, licitações suspeitas e pagamentos sem contratos) em seis hospitais federais do Rio. E soube-se, por pesquisa da Comissão Nacional de Biossegurança, que cem mil pessoas morrem por ano no Brasil por infecção hospitalar.

São dados que nacionalizam inquestionavelmente a tragédia da Saúde. Neste último caso, imprime-se à desgraça um viés macabro. A estatística da comissão mostra que a cada 365 dias morrem quase duas vezes mais brasileiros em hospitais — por princípio um espaço de preservação da vida — do que o total de soldados americanos abatidos em batalhas durante toda a Guerra do Vietnã.

É apavorante o raio X que a pesquisa, divulgada pelo GLOBO, faz das condições de higiene na rede hospitalar (pública e privada). Em média, 80% dos hospitais brasileiros não fazem o controle adequado. Como é falho o monitoramento pelos órgãos públicos de fiscalização, chegou-se a este número por estimativa, o que significa que a dimensão do problema pode ser maior. Há razões para acreditar que seja.

Afundada numa crise sistêmica, a Saúde coleciona um infindável histórico de demandas que deveriam ser enfrentadas com uma política capaz de mudar estruturalmente o setor. Mas, à exceção de exemplos pontuais, não é o que se vê país afora. E apenas piora a situação uma estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS) segundo a qual infecções hospitalares atingem 14% dos pacientes internados.

É fato que políticas públicas do país não são especialmente generosas com o setor. Pode-se destinar mais recursos à rubrica. Mas, em vez de acabar com o drama que deixa milhões de brasileiros à margem do fundamental direito à Saúde, despejar dinheiro nesse sistema falido, sem tampar os ralos que abastecem a corrupção e premiam a inépcia, corresponderia a apostar alto num cavalo manco.

É o que pretendia a base do governo federal (cuja proposta de ressuscitar a CPMF afundou no Congresso) — avançar no bolso do contribuinte para custear programas viciados pela fraude e pela ineficiência, sem mudar radicalmente as formas de gestão do sistema, sem enfrentar o corporativismo que protege os maus profissionais e sem adotar uma série de outras providências essenciais para tirar a Saúde da UTI. 

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