RENATO ESSENFELDER - A rede virou um espelho de Branca de Neve moderno. Não é má em si, mas se alimenta de nosso mal profundo. Está sempre a mostrar que alguém é mais bela do que você, mais rica do que você, mais feliz do que você… que não sabe lidar com isso.
»Não temos maturidade para o Facebook. Talvez a mais fantástica ferramenta de comunicação já criada: rápida, fácil, acessível, flexível. Você pode ter descoberto este texto pelo Facebook. E então pode comentá-lo, compartilhar; até filosofar, fazer destes bytes uma conversa de bar. Se não gostar, insista navegar: achará bilhões de outros textos pela rede, facilmente, e quem sabe o que mais.
É mais ou menos assim que a maioria dos meus colegas vê o Face. Incrível instrumento para compartilhar conteúdos, encontrar pessoas, estudar, conhecer, bater papo. A revolução pode não ser televisionada, como dizem, mas certamente será facebookeada.
Eu, no entanto, como naquele poema do Fernando Pessoa, eu torto e sem graça, o único que não é príncipe na tabacaria, tristemente discordo. O Facebook, as redes sociais em geral, poderiam ser uma maravilha emancipatória. Poderiam. Não são.
O que vi nestes anos de rede social, comparados à minha juventude pré-facebook, é desalentador. As crianças de dez anos já o sabem. A gente não tem coragem de “falar na cara”, mas, na frieza das teclas, espalha os maiores absurdos. Vomitam preconceitos, ódio, incompreensão. A terrível inveja, o querer destruir aquilo que não se tem. A rotina.
Nas telas, sem filtros e sem empatia, cometemos os horrores que pessoalmente não ousaríamos.
Não temos maturidade para o Facebook. Num outro mundo, talvez, as coisas fossem diferentes. Gostaríamos de dialogar, discutir civilizadamente. Saberíamos usar a rede para outra coisa senão massagear nossos frágeis egos, perseguir implacavelmente uma aprovação que não virá. Seríamos menos hipócritas, mais sinceros. Em outro mundo.
Neste, o que fizemos com as redes sociais? Espelho mágico de vaidade e ambições, o Facebook é um espelho de Branca de Neve moderno. Não é mau em si, mas se alimenta de nosso mal profundo. Um espelho deformado que está sempre a mostrar que alguém é mais bela do que você, mais rica do que você, mais culta do que você, mais feliz do que você… que não sabe lidar com isso. Um alguém, claro, fantasmagórico, que só existe ali, no espelho.
Não importa, o efeito é o mesmo. Confrontados com um mundo de fantasia, liberamos as porções mais sombrias do ego. Espalhamos maçãs envenenadas por chats, mensagens, posts, vídeos, fotografias. Às vezes, um inocente morde. É pena – poderíamos ser tão melhores, mas:
Não temos maturidade para o Facebook.
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