29 de set. de 2021

Um pouco dos bastidores do Amazonia 1

Conversa com gerente de projetos mostra a dedicação de todos os envolvidos

“Na Índia, eles têm um ritual hindu de, em situações importantes, fazer oferenda a Deus. Essa oferenda consiste em quebrar cocos e jogar pétalas de rosas no objeto a ser abençoado. Isso também ocorreu com o Amazonia 1, quando o satélite ia ser transportado do centro técnico para a torre de lançamento, diversas pessoas quebraram os cocos e jogaram pétalas e rosas no caminhão que levava o Amazonia 1 para o lançamento”, diz Adenilson Silva, gerente de satélite do projeto Amazonia 1 e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

Essa é apenas uma das histórias interessantes que a equipe do Amazonia 1 teve durante seus trabalhos. O satélite foi um projeto complexo, de grande magnitude, que exigiu muito de todos os envolvidos e levou anos para sua realização. Somente para se ter uma ideia de sua magnitude, foi necessário utilizar 6 quilômetros de fios e 14 mil conexões elétricas para que todo o satélite estivesse eletricamente conectado. Tudo isso exaustivamente testado, o que resultou em mais de 2.000 horas de testes elétricos.

O processo de desenvolvimento e qualificação de qualquer equipamento para uso no espaço é extremamente custoso. Foi um trabalho bastante longo e árduo e teve uma série de desafios, sejam de origem técnica ou de logística. Desde o início, além do desenvolvimento em si, uma das metas do programa foi tentar impulsionar a indústria nacional, com grandes desafios tecnológicos para a realidade do Brasil. “Estávamos fazendo algo novo para a realidade do país e muitas coisas que nunca tinham sido feitas antes”, revela Adenilson.

Para se ter o satélite Amazonia 1 pronto para o lançamento, foi preciso vencer todas as etapas características desse tipo de projeto: desenvolvimento, qualificação, integração, testes e operação. Além de garantir as funcionalidades dos equipamentos, subsistemas, integração e testes, foi mandatório certificar-se que o satélite chegaria íntegro ao espaço e que seu funcionamento seria assegurado por vários anos.

“A fase de qualificação é uma das mais custosas e exigentes, pois os equipamentos precisam suportar acelerações extremas (em torno de 10 vezes da aceleração da gravidade), grandes variações de temperatura (que podem variar de -95 a 95 graus centígrados, na parte externa, em 100 minutos) e o efeito inóspito da radiação no espaço”, continua Adenilson.

Devido às condições extremas acima descritas, e sem possibilidade de se fazer reparos uma vez em órbita, o conjunto de testes teve que ser desenhado de forma a contemplar todas as variações, inclusive inúmeras situações de falhas. Os equipamentos e subsistemas passaram por outras dezenas ou, até mesmo, centenas de horas em testes antes de serem integrados ao satélite.

A parte de preparação do segmento solo para o lançamento, operações iniciais e operação de rotina representa outro significativo avanço na área de projetos espaciais. Foram meses de treinamento, dezenas de pessoas envolvidas, diversas revisões e ensaios realizados para que tudo corresse de forma que a missão como um todo fosse um sucesso.

“Toda essa trajetória, dessa complexidade, nunca tinha sido completamente feita antes no Brasil. Nós conseguimos algo para nos orgulhar. Penso que poucas dezenas de países do mundo fizeram um desenvolvimento completo como esse”, opina Adenilson.

E tiveram muitos percalços no caminho. Um dos momentos mais difíceis foi a logística para levar o equipamento à Índia para a campanha de lançamento, um esforço que exigiu que os envolvidos ficassem por volta de 45 horas ininterruptas acompanhando o transporte envolvendo dezenas de pessoas num cenário de pandemia.

Houve também vários incidentes que, mesmo visto hoje com humor, renderam muitos momentos tensos quando aconteceram. Como em 2018, quando um problema de logística acabou por autorizar o envio de componentes do Amazonia 1 para Rússia, em plena Copa do Mundo.

Também houve acontecimentos bizarros, como quando uma parte da equipe estava em Bariloche, na Patagônia argentina, e houve uma infestação de ratazanas que, de acordo com os moradores, ocorre a cada 100 anos. “Os locais nos disseram que, a cada centenário, floresce uma flor rara do deserto que atrai as ratazanas, que invadem a cidade”, conta Adenilson.

O projeto do Amazonia 1 é um orgulho para o país. A Agência Espacial Brasileira (AEB) se orgulha de ter feito parte do projeto. Essa empreitada nos lembra a importância da persistência e da dedicação dos profissionais em trazer o melhor da tecnologia para o Brasil e como não devemos desanimar perante as dificuldades, tendo sempre como alvo o objetivo final. Parabéns a todos os envolvidos!

Amazonia 1

O Amazonia 1 é o primeiro satélite de observação da Terra completamente projetado, integrado, testado e operado pelo Brasil.

 Plataforma Multimissão (PMM)

A Plataforma Multimissão (PMM) representa um conceito moderno de arquitetura de satélites, que tem o propósito de reunir, em uma única plataforma, todos os equipamentos que desempenham funções necessárias à sobrevivência de um satélite, independentemente do tipo de órbita: apontamento, geração de energia, controle térmico, gerenciamento de dados e telecomunicação de serviço. Ou seja, é capaz de atender os requisitos da missão e se adaptar a diferentes cargas úteis.

As principais vantagens de uma plataforma multimissão são a redução de custos e de prazos no desenvolvimento de novas missões que a utilizem como base, uma vez que, após o desenvolvimento e qualificação da primeira plataforma, sua reprodução dispensaria as longas e dispendiosas etapas de desenvolvimento e qualificação característicos de projetos espaciais. Outro ponto importante a ser notado se refere aos aspectos de confiabilidade, visto que as missões futuras são beneficiadas com a maturidade do projeto.

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