27 de mar. de 2013

PARLAMENTAR CONDENADO À PRISÃO RENUNCIA. EM BRASÍLIA? NÃO, EM LONDRES

O político britânico Chris Huhne fala com a imprensa diante do tribunal. 
Ele assumiu que, há dez anos,tentou fraudar pontos
de sua carteira de motorista (Foto: Sang Tan/AP)
O liberal-democrata Chris Huhne achou que um pequeno pecado, cometido dez anos atrás, seria esquecido. Não foi.


ÉPOCA/ROGÉRIO SIMÕES - O público brasileiro, diante de um Congresso de escassa credibilidade, adoraria ver um deputado pagando por um crime, com a renúncia e uma sentença de prisão. Pois foi o que se viu nesta segunda-feira (4). Não em Brasília, mas em Londres. O parlamentar e ex-ministro britânico Chris Huhne, antes uma respeitável voz na discussão sobre os problemas do país, saiu da sede de um tribunal para falar rapidamente com a imprensa: “Eu me declarei culpado”, disse. “Tendo assumido a responsabilidade por algo que aconteceu dez anos atrás, a única atitude apropriada para mim é renunciar ao meu assento no Parlamento.” Huhne, de 58 anos, espera agora ser condenado à prisão. E o que aconteceu dez anos atrás que o fez renunciar? Em 2003, o carro do parlamentar foi pego em excesso de velocidade, e ele convenceu sua mulher a assumir a culpa para não ser processado. Chris Huhne perdeu o mandato e aguarda por um período atrás das grades porque tentou fraudar pontos da sua carteira de motorista.

O caso indignou os britânicos. Huhne era um importante integrante da coalizão governista liderada pelo premiê conservador David Cameron. Como titular da pasta de Energia e Mudanças Climáticas, de 2010 a 2012 foi um dos principais representantes no governo dos liberais-democratas, o menor partido da coalizão. Formado na francesa Sorbonne e na inglesa Oxford, Huhne quase chegou à liderança do partido Liberal-Democrata, uma legenda reconhecida por um passado de correção na atividade político-partidária. Parecia um parlamentar perfeito, que segue tudo como manda o figurino. Tudo, porém, foi por água abaixo por causa de alguns pontos na carteira de habilitação.
Chris Huhne chega ao tribunal com Carina Trimingham.À direita, a ex-mulher do parlamentar, Vicky Pryce, chega à corte (Foto: Sang Tan/AP)


Os presentes ao julgamento souberam também que a atitude de Huhne não deixou indignados apenas a polícia e o Judiciário. Mensagens de celular trocadas entre o parlamentar e o seu filho, Peter, revelaram que o episódio provocou uma crise familiar. Em uma mensagem enviada ao seu pai, em junho de 2010, Peter disse: “Todos nós sabemos que você estava dirigindo, mas você colocou pressão sobre a mamãe. Aceite isso ou enfrente as consequências”. Pouco mais tarde, o filho escreveu: “Você vai aceitar que é responsável ou eu terei de contatar a polícia e dizer a eles o que você me disse?”. O fato de Huhne ter iniciado na mesma época um caso com Carina Trimingham, uma militante do partido, atrapalhou ainda mais a relação com a família. Huhne acabou deixando sua mulher, Vicky Pryce, com quem foi casado por 26 anos, para ficar com Trimingham. Pryce, que arcou com os pontos por alta velocidade, também está sendo acusada de atrapalhar os rumos da Justiça. Ela alega inocência, mas será julgada separadamente. 

Há um ano, Huhne deixou o cargo de ministro para se defender das acusações. Dizia ser inocente e, nos meses seguintes, fez de tudo para tentar derrubar o processo. Dizia ser vítima de uma falsa acusação e prometia limpar o seu nome – comportamento corriqueiro entre figuras públicas, de Silvio Berlusconi a Lance Armstrong. Na semana passada, ele ainda negava ter cometido qualquer crime, o que ele admitiu apenas nesta segunda-feira, no início do julgamento. Ao falar da gravidade do crime e da pena que o parlamentar deve receber, o juiz não economizou na dose. Dirigiu-se ao ex-ministro e disse: “Você não deve ter nenhuma ilusão sobre o tipo de sentença que você provavelmente receberá. Entendeu?”. O agora ex-parlamentar balançou a cabeça, sinalizando ter entendido. Como se vê, vida de parlamentar não é tão fácil quanto se imagina. Pelo menos no Reino Unido.

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