Alguns executivos do petróleo dos EUA e credores de Wall Street abraçam silenciosamente o presidente; opositores dizem que a democracia é necessária para restaurar o estado de Direito
Por Kejal Vyas - Nicolas Maduro, Venezuela’s president, listens during a meeting with Sergei Lavrov, Russia’s foreign minister, not pictured, at Miraflores Palace in Caracas, Venezuela, on Tuesday, Feb. 20, 2024. Russia and Venezuela agreed to broaden their oil production cooperation, Russia’s Lavrov said from Caracas.
Ansioso por impulsionar a indústria petrolífera, o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, visitou uma instalação de bombeamento de petróleo recentemente, quando se voltou para uma câmera de televisão estatal para fazer um discurso de vendas para investidores americanos.
“Seu investimento é bem-vindo aqui, para que possamos trabalhar juntos rumo a um relacionamento diferente entre os EUA e a Venezuela”, disse Maduro, ao visitar uma fábrica da Chevron que reabriu no ano passado. “Garantimos estabilidade, segurança jurídica, paz, relações onde todos têm a ganhar.”
Em particular, alguns executivos de petróleo americanos e credores de Wall Street concordam.
Durante seus 11 anos no cargo, Maduro comandou um colapso econômico que prejudicou o outrora potente setor de energia e levou um quarto da população a deixar do país. Mas, às vésperas da eleição presidencial de domingo (28), ele se vende como o candidato pró-negócios, mesmo que diplomatas e analistas digam que só conseguirá vencer fraudando a votação, como fez seis anos atrás.
Alguns empresários dos EUA que se envolveram em conversas de bastidores com Maduro no ano passado — e pressionaram o governo Biden a suspender as sanções econômicas — dizem preferir “o diabo que conhecemos”, pois veem o regime como uma opção mais estável de investimento. E, pragmaticamente, acreditam que ele permanecerá no poder, seja roubando votos de Edmundo González, diplomata venezuelano aposentado pouco conhecido que as pesquisas mostram que venceria facilmente a eleição, ou cancelando a votação.
Maduro, embora altamente impopular nas pesquisas, detém todos os mecanismos do poder, dos tribunais aos militares. Se a oposição vencer, dizem os executivos americanos, a Venezuela corre o risco de mergulhar no caos, acabando com as esperanças de restaurar o país como um importante fornecedor de petróleo para os EUA. Um poderoso aliado de Maduro adverte que um governo rival cairia, ecoando o sentimento entre os investidores que temem uma transição confusa liderada pelo retorno dos exilados.
“Isso seria um desastre”, disse um executivo americano que se envolveu com Maduro. “O que você acaba tendo é o pior cenário para a segurança energética da região. Minha recomendação… trabalhar com esse cara por mais seis anos.”
Nas aparências, o desempenho passado de Maduro oferece pouca confiança em questões econômicas.
Em sua primeira década no poder, a economia contraiu cerca de 80% e a produção de petróleo despencou. O governo entrou em default. As sanções econômicas dos EUA transformaram o país em um pária para os bancos. Mais de mil empresas foram nacionalizadas sob o antecessor de Maduro, Hugo Chávez. A maioria delas colapsou.
No entanto, Maduro diz que só ele é capaz de reviver a Venezuela e promete um “grande diálogo nacional” com todos os atores políticos e econômicos. Porém, ele alertou que haverá um banho de sangue, em suas próprias palavras, se perder a votação.
“Sou um homem de palavra, um cara confiável”, disse ele na visita à fábrica da Chevron, divulgando dez novos acordos que seu governo assinou com investidores, sem nomeá-los.
Além disso, talvez de modo surpreendente, Maduro ofereceu o que parecia ser um gesto de reconciliação em relação a Biden, falando de seu respeito pela decisão do presidente americano de renunciar à campanha de reeleição. E ofereceu palavras de solidariedade a Donald Trump após a tentativa de assassinato deste mês, um sinal de que pode tentar redefinir as relações se Trump vencer a eleição de novembro.
“Somos adversários, mas desejo ao presidente Trump boa saúde e uma vida longa”, disse Maduro.
Nos bastidores, Maduro tem oferecido oportunidades lucrativas para empresas americanas, na esperança de obter ajuda para convencer Washington a reconhecer seu governo como legítimo e acabar com as sanções, muitas das quais já foram suspensas, de acordo com pessoas familiarizadas com as reuniões em Caracas entre assessores de Maduro e executivos americanos.
Para um governo que proclama em voz alta seus ideais socialistas e cujos líderes condenam o que chamam de “capitalismo selvagem”, a Venezuela está abertamente fazendo todo o possível para atrair investimentos.
Para os executivos do petróleo, isso inclui retornos generosos e controle operacional sobre joint ventures, nos moldes do cobiçado modelo contratual da Chevron. As condições, que lembram o início da Venezuela como grande produtora de petróleo há um século, incluem a chance de garantir contratos sem licitação e sem a supervisão ambiental comum em outros países. Para quem possui títulos, o governo mencionou a possibilidade de receitas futuras do petróleo, além de negociar diretamente uma reestruturação de cerca de US$ 60 bilhões em dívidas sem intermediários tradicionais como o Fundo Monetário Internacional.
“É incrível o quão longe eles estão dispostos a ir para tornar a situação atraente”, disse Francisco Monaldi, estudioso latino-americano de energia da Universidade Rice.
Executivos de empresas petrolíferas americanas e europeias, traders de commodities e grandes fundos de dívida, incluindo o Ashmore de Londres e o Greylock Capital, com sede em Connecticut, visitaram a Venezuela para se reunir com empresários e autoridades governamentais para avaliar o clima econômico depois que os EUA afrouxaram as sanções no ano passado. As conversas com assessores de Maduro cobriram tudo, desde desafios de investimento até a eleição dos EUA.
Um investidor, em sua primeira visita a Caracas, lembrou-se de ruas bem pavimentadas, supermercados abastecidos e refeições ao ar livre em um luxuoso clube de campo. “É uma cidade linda”, disse ele. “Me senti muito seguro.”
Algumas empresas saíram com novos acordos, entre elas a LNG Energy Group, ligada ao bilionário texano e produtor de petróleo Rod Lewis, que assinou um acordo em abril para assumir cinco campos de petróleo no leste da Venezuela, embora na maior parte do tempo o governo ainda lute para atrair o investimento de que o país precisa.
Maduro às vezes até intercedeu pessoalmente para facilitar os negócios.
Em uma reunião, um executivo compartilhou a preocupação de ter que negociar por meio do principal interlocutor de investimentos de Maduro, Alex Saab, que enfrentava acusações de lavagem de dinheiro no tribunal federal de Miami até dezembro, quando os EUA o liberaram em uma troca de prisioneiros com a Venezuela.
Maduro disse ao executivo para deixar Saab de lado e ligar diretamente para o palácio presidencial no futuro.
“Ele resolveu na hora”, disse uma pessoa com conhecimento do caso.
Foto: Gaby Oraa/Bloomberg
Outros executivos de negócios, no entanto, não veem estabilidade vindo de um governo autoritário que ainda não é reconhecido por muitos países ocidentais como legítimo. Os investidores em infraestrutura, por exemplo, são a favor de uma transferência de poder para restabelecer o estado de Direito, que garantiria uma receita estável em longo prazo, disse um empresário local sênior.
Uma fraude eleitoral flagrante também dificultaria para os EUA e seus aliados europeus a remoção de medidas punitivas contra o regime, segundo José Ignacio Hernández, ex-conselheiro da oposição.
“A ideia de que a comunidade internacional mudaria de atitude e o ajudaria como ditador é um mito”, disse Hernández. “A natureza de Maduro é predatória por definição.”
As empresas continuam enfrentando uma miríade de desafios existentes na Venezuela, incluindo quedas de energia, regulamentações bancárias fracas e falta de dados econômicos confiáveis, disse o economista do petróleo Orlando Ochoa.
Para os investidores, as perspectivas do país dependem, em última análise, do reconhecimento internacional das eleições, crucial para que a Venezuela restabeleça os laços diplomáticos e comerciais.
O governo Biden tentou convencer Maduro a realizar uma eleição livre e justa em troca do alívio das sanções, fazendo concessões que permitiram que a Chevron e outras empresas retornassem à Venezuela. Um alto funcionário dos EUA afirmou que a normalização das relações poderia impulsionar a economia venezuelana, conter a migração e permitir que as empresas ocidentais recuperem uma posição em um país onde Irã, Rússia e China fizeram incursões.
Contudo, grupos de direitos humanos e autoridades dos EUA dizem que Maduro respondeu banindo seus principais rivais eleitorais e prendendo repetidamente dissidentes, mesmo recentemente. Em resposta, o governo Biden retirou em abril uma ampla licença para as empresas petrolíferas americanas operarem na Venezuela, mas tem discretamente concedido licenças individuais para permitir que elas permaneçam no país.
Um dos destaques nas discussões em uma conferência em Londres organizada no mês passado pela Dentons, empresa de consultoria soberana contratada pela Venezuela desde 2017, foi como Maduro conseguiria permanecer no poder e recuperar a legitimidade. O evento reuniu uma série de atores, desde um magnata do rum venezuelano e diplomatas estrangeiros até corretores de títulos e investidores em petróleo. Um pesquisador de Caracas disse aos participantes que Maduro poderia obter uma vitória confiável o suficiente para conquistar a comunidade internacional.
Mas outros disseram que a única maneira de recuperar a estabilidade econômica e a credibilidade internacional seria se Maduro e seus adversários trabalhassem juntos.
“Vamos dar uma chance à reforma”, disse o mediador do conflito do Sri Lanka, Ram Manikkalingam, em um discurso, baseando-se na brutal guerra civil de seu próprio país.
Contudo representantes do governo dos EUA e da oposição estavam ausentes da conferência.
González, o diplomata aposentado que está desafiando Maduro na eleição de domingo, disse que o discurso de investimento do regime é muito pouco, muito tarde, depois que o partido socialista governista passou grande parte das últimas duas décadas esnobando empresas estrangeiras.
“Poucas pessoas vão levar isso a sério”, afirmou González em uma entrevista. “A realidade é que este é um país que perdeu investimento estrangeiro, maltratou investidores e onde não dá para confiar nas regras.”
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