Possível escolha de crítico da Lava-Jato para a Justiça causa polêmica
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O ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles Jorge William / Agência O Globo |
JORGE BASTOS MORENO E DANIELLE NOGUEIRA - O vice-presidente Michel Temer admitiu na terça-feira que Henrique Meirelles é o seu preferido para ocupar o Ministério da Fazenda em um eventual novo governo. Com larga experiência no mercado financeiro e sólida passagem pelo setor público — é o mais longevo presidente do Banco Central (BC) — seu nome foi bem recebido pelo mercado e no meio empresarial. Pesam a seu favor, segundo economistas, a capacidade de resistir às pressões políticas e, ao mesmo tempo, ser bom negociador, talento apontado como crucial para aprovação junto ao Congresso de uma agenda econômica impopular para tirar o país da crise fiscal.
Em entrevista ao jornalista Jorge Bastos Moreno, publicada no site do GLOBO, Temer disse que tem feito apenas “sondagens” para montar um possível novo ministério, mas afirmou ter ficado “muito bem impressionado" com a conversa que teve com Meirelles. Depois, disse que delegaria “ao Meirelles” o direito de indicar o presidente do Banco Central e outros integrantes da equipe. Flagrado na gafe, tentou corrigir:
O secretário estadual de Esporte do Rio, Marco Antônio Cabral recebe medalha do pai, o ex-governador Sérgio Cabral. Ao fundo, o prefeito do Rio, Eduardo PaesPMDB do Rio pode emplacar filho de Cabral em eventual governo Temer
— Falei “Meirelles” porque, hoje, estou com esse nome na cabeça. Repito: fiquei muito bem impressionado com a conversa que tive com ele. Então, confesso que se eu tivesse que assumir hoje, o ministro da Fazenda seria ele — afirmou Temer.
O vice indicou ainda que Eliseu Padilha (PMDB-RS) poderia ocupar a Casa Civil; insinuou que José Serra (PSDB-SP) assumiria a pasta de Educação; reconheceu que o advogado Antonio Cláudio Mariz de Oliveira (PSB-SP) seria um bom nome para a Justiça, e defendeu o bom trânsito de Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) no Congresso como ponto favorável para exercer a articulação política.
A notícia de que Meirelles poderia vir a ocupar a Fazenda foi um dos motivos que fizeram a Bovespa subir 2,35% na terça-feira. Para o ex-diretor do BC e atual economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Carlos Thadeu de Freitas, a boa recepção do mercado tem a ver com o fato de Meirelles ser “o homem do não”. Por ter assumido a presidência do Banco Central em 2003, quando o mercado temia o que poderia ocorrer com a política econômica no primeiro governo Lula, Meirelles teve de ser duro para manter a independência da instituição.
— Ele sabe dizer não. Soube resistir às pressões políticas para baixar os juros. Saberá dizer não para os estados, que tentam renegociar suas dívidas com a União — disse Carlos Thadeu.
O ex-diretor do BC ressalta, porém, que Meirelles é um monetarista, e não um fiscalista, ou seja, está acostumado a lidar com juros, inflação e moeda, mas não tem experiência no manejo das contas públicas. Por isso, diz, seria interessante nomear para o Planejamento alguém acostumado com a política fiscal. Na possível nova composição, o nome mais cotado para a pasta é o de Romero Jucá (PMDB-RR), que foi relator do Orçamento de 2013 e 2015.
POSSÍVEL MINISTRO DA JUSTIÇA GERA POLÊMICA
A rigidez na política monetária é um dos pontos fortes de Meirelles ressaltados por Alexandre Póvoa, presidente da gestora Canepa Asset. Na avaliação de Póvoa, o eventual futuro ministro terá de ser transparente com objetivos para trazer a inflação de volta ao centro da meta, de 4,5% ao ano. Em 2015, o índice de preços passou a marca de 10%, o que não ocorria desde 2003. Outra característica de Meirelles, lembra Armando Castelar, coordenador de economia aplicada do Ibre/FGV, é a capacidade de montar uma boa equipe, “pois não se faz nada sozinho”.
O bom trânsito político de Meirelles, que já foi deputado federal pelo PSDB e hoje é filiado ao PSD, também é ressaltado como uma qualidade necessária para tocar o ajuste fiscal. Para José Carlos Martins, presidente da Cbic, associação que reúne construtoras, Meirelles aparenta ter mais “força política” que o ex-ministro Joaquim Levy para negociar com o Congresso.
— A questão fiscal é a prioridade. É uma importante estratégia de comunicação eleger um nome para a Fazenda com credibilidade suficiente não apenas para as medidas de curto prazo, como de longo prazo para recuperar o estrago já feito — disse o chefe para pesquisa macro do banco americano Goldman Sachs, Alberto Ramos.
Apesar das reclamações nos bastidores da excessiva influência de Eliseu Padilha e Moreira Franco junto a Temer, o grupo do PMDB do Senado, liderado por Eunício Oliveira (CE), acabou “aceitando” a potencial escolha de Padilha para comandar a Casa Civil. A mudança de postura, pelo menos da parte de Eunício, ocorreu depois de conversas com integrantes do núcleo mais próximo de Temer. Nesta quarta-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), se reunirá com Temer para tentar “aparar arestas”.
— O Padilha trabalha muito e é bem organizado. O governo precisa de um perfil desses para a Casa Civil. Os ministros José Dirceu e Palocci não deram certo porque tentaram politizar o cargo — afirmou Temer, frisando que respeita o Senado mas precisa estar preparado para um possível afastamento de Dilma da Presidência.
Quanto a Serra, Temer disse que “o senador cabe em qualquer cargo de governo”, mas que “tudo vai depender da decisão do PSDB” — que, na terça-feira, decidiu dar apoio a Temer, após divergências internas. Em relação ao delicado Ministério da Justiça, o vice reconheceu ter forte tendência a indicar Mariz de Oliveira, homem de sua confiança, e minimizou o fato de o advogado ter assinado manifesto contrário à Lava-Jato:
— Qualquer pessoa que venha a ocupar o Ministério da Justiça estará consciente e orientado sobre a posição do governo de preservar a independência dos investigadores da Lava-Jato.
A possível indicação de Mariz gerou polêmica. Ele ganhou notoriedade pela defesa de réus poderosos, como a executiva do Banco Rural Ayanna Tenório, a quem conseguiu absolver no mensalão, e Eduardo Hermelino Leite, vice-presidente da Camargo Corrêa, envolvido na Lava-Jato.
— Mesmo que tenha assinado (o manifesto contra a Lava-Jato), nem ele, o presidente da República, nem ninguém sensato acha que será capaz de barrar as investigações — disse Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB. (Colaboraram Simone Iglesias, Maria Lima e Mariana Sanches)