Por Aline Rechmann, Gazeta do Povo - A gestão de Marina Silva à frente do Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima (MMA) vem enfrentando diversos impasses com outras pastas no terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O mais recente envolve o processo de exploração de potássio na região de Autazes, no Amazonas. A ministra vem se opondo a iniciativas como a exploração de petróleo na margem equatorial, alegando que critérios ambientais não estão sendo respeitados. No caso de Autazes, não deve ser diferente.
Tudo indica que a ministra Marina Silva terá de enfrentar uma importante ala do governo para frear a exploração de potássio em Autazes. Os ministérios de Minas e Energia e de Agricultura e Pecuária têm manifestado apoio à exploração, destacando a importância da exploração para o desenvolvimento da região e fortalecimento do agronegócio. O potássio é um minério essencial para produção de fertilizantes da agricultura, largamente utilizado no Brasil.
Há ainda o posicionamento favorável à exploração manifestado pelo vice-presidente e ministro Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin. O vice-presidente foi, inclusive, o primeiro a receber a visita de representantes da Potássio do Brasil, empresa de mineração que tem a licença prévia para exploração em Autazes.
Uma forte aliada de Marina deve ser a peça-chave para impedir, ou pelo menos atrasar, o andamento do projeto: a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara. O ministério chefiado por ela já manifestou sua posição “enfaticamente contrária” à exploração de potássio em Autazes. Além disso, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) formou um grupo de trabalho para a demarcação de uma terra indígena na área prevista para exploração. Os estudos para demarcação iniciaram após uma decisão da justiça que pediu que a questão indígena seja reavaliada.
Ministros de Lula receberam empresa que quer explorar potássio em Autazes
A empresa que pleiteia a exploração de potássio em Autazes vem buscando apoio de membros do governo Lula para conseguir destravar o projeto. No início deste ano, o presidente da Potássio do Brasil, Adriano Espeschit, já apresentou o projeto ao ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e ao vice-presidente, Geraldo Alckmin.
Após receber a visita do empresário, o vice-presidente Geraldo Alckmin citou a exploração de potássio como uma alternativa para turbinar o modelo Zona Franca de Manaus (ZFM) e atrair “potências” do mercado de fertilizantes. Ele também criticou a demora para a aprovação da licença para exploração do minério.
“Potássio é Amazonas. Potássio é Autazes. Nós vamos trabalhar com empenho pra gente resolver o problema jurídico. Não é possível levar 5 anos para discutir competência, se a competência do licenciamento é do Ibama ou do Ipaam. Não é possível. Esse pode ser um dos maiores investimentos do país, nesta mina de potássio e o Brasil deixar de importar 98% de potássio”, disse Alckmin durante um evento para empresários em Manaus.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, também demonstrou interesse pelo tema ao defender que a produção de fertilizantes seja tratada como assunto de segurança nacional. Ele fez as afirmações em entrevista ao jornal O Globo, ainda em seus primeiros dias à frente da pasta. Na entrevista, Fávaro afirmou também que a Petrobras deve retomar a construção de três fábricas de fertilizantes no país e citou Autazes, enfatizando que a jazida estaria fora de área indígena.
Já em setembro, o presidente da empresa esteve novamente em Brasília e, acompanhado do deputado estadual do Amazonas, Sinésio Campos (PT/AM), e do secretário de estado de Mineração, Gás e Energia do Amazonas, Ronney Peixoto, cumpriu agenda na Esplanada dos Ministérios. Eles estiveram com o secretário especial de Assuntos Federativos do Ministério de Relações Institucionais, André Luiz Ceciliano, e com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha.
Por outro lado, a ministra Marina, em visita a Manaus em março de 2023, quando questionada sobre a exploração de potássio em Autazes argumentou sobre a viabilidade do empreendimento. “A gente tem que pensar que ele [projeto] tem que ter viabilidade econômica, viabilidade social e viabilidade ambiental. Quando você tenta viabilizar todas essas questões, não é que está travado, é que você tem que resolver o problema”, disse a ministra do Meio Ambiente.
Decisão judicial afastou possibilidade de exploração
Além dos entraves junto ao governo federal, a liberação para exploração ficou ainda mais distante após uma decisão da 1ª Vara Federal Cível do Amazonas, publicada em agosto. A decisão tratou de anular a licença de exploração de potássio na região de Autazes emitida pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam). A decisão da juíza federal Jaiza Fraxe afirmou que o órgão ambiental competente para licenciamento da exploração de potássio pela empresa Potássio do Brasil é o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Se for mantida a decisão da Justiça Federal do Amazonas, o processo precisará passar pelas três fases que compreendem o processo de licenciamento: licença prévia, licença de instalação e licença de operação. Sendo assim, pelo menos uma das etapas, a de licença prévia, terá que ser feita novamente. A primeira licença prévia obtida pela empresa Potássio do Brasil em Autazes demorou cerca de dois anos para ser emitida pelo Ipaam.
Questão indígena em Autazes pode dificultar exploração de potássio
Fazendo coro à resistência de Marina Silva ao tema, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, tem reforçado os entraves para a exploração de potássio em Autazes. Em maio, a ministra pediu que fossem apuradas ameaças ao povo Mura, visando a exploração do potássio na região por eles habitada. Já em agosto, a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), criou grupo de trabalho para a demarcação de uma nova terra indígena na região.
No entanto, buscando atender as exigências do Justiça Federal de consulta aos povos indígenas, a empresa Potássio do Brasil, juntamente com o governo do Amazonas se reuniu com um grupo de indígenas do povo mura em Autazes. As lideranças indígenas dos muras consultadas, que habitam terras em Autazes (a 112 quilômetros da capital, Manaus), manifestaram apoio ao avanço na exploração do potássio no município. O apoio, porém, foi contestado por outras lideranças do mesmo povo Mura.
Embora a empresa afirme que o empreendimento está fora de terras indígenas, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) afirma que há sobreposição do projeto. Para o MPI o empreendimento tem área de influência com sete terras indígenas regularizadas ou de domínio indígena, concentrando mais de 1.164 famílias. “As aldeias Paracuhuba e Jauary, por exemplo, estão em um raio de 10km do empreendimento, o que já seria fator impeditivo para a autorização de pesquisa mineral na área”, afirmou o MPI em resposta à Gazeta do Povo.
Potencial de produção em Autazes pode suprir 20% da necessidade de potássio no país
Pelo menos desde 2008 sabe-se da possibilidade de exploração de potássio em Autazes. Foi neste ano que foi iniciada a pesquisa mineral na área do projeto. Entre 2010 e 2013, aconteceram as sondagens geológicas e descoberta da jazida em Autazes. Após essa fase, em 2013, o licenciamento ambiental foi iniciado junto ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas, sendo a licença prévia emitida em 2015 (LP 054∕2015).
Somente em 2016, o Ministério Público Federal ajuizou Ação Civil Pública suspendendo a LP 054/2015 condicionando-a à consulta com o Povo Indígena Mura a ser realizada conforme Convenção OIT 169. A consulta foi iniciada em 2019, mas foi suspensa em 2020, devido à pandemia de Covid.
De acordo com a empresa Potássio do Brasil, “quando atingir a produção anual média de 2,2 milhões de toneladas de cloreto de potássio, a oferta deste insumo corresponderá a cerca de 20% do volume consumido no Brasil”. Estudos preliminares indicam, entretanto, um potencial de aumento da capacidade de produção, podendo atingir até 45% das necessidades brasileiras. Estudos feitos pela empresa, apontam ainda que o empreendimento tem vida útil estimada em aproximadamente 23 anos.
De acordo com informações repassadas pelo Ministério de Minas e Energia, hoje a produção nacional de potássio se concentra no estado de Sergipe não sendo suficiente para atender 10% da demanda nacional.
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