O Super Tucano fará a abordagem de aeronaves lentas, como aviões a hélice, helicópteros, ultraleves e até mesmo aeromodelos Força Aérea Brasileira |
O governo federal brasileiro está preparando um esquema de defesa aérea para proteger os estádios e praças esportivas do país contra eventuais ataques - terroristas ou não - durante a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016. O plano, porém, só contará com todo o equipamento esperado depois do Mundial de futebol, que ocorre em junho de 2014.
A tarefa está sob responsabilidade do Comdabra, ou Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro, subordinado diretamente à Presidência da República. A operação, similar à que foi montada durante a Rio +20 no ano passado, baseia-se em um sistema de linhas de defesas concêntricas. A última delas deveria ser composta por mísseis guiados por radar, mas este equipamento, que está sendo negociado com a Rússia, não deverá estar pronto para operar até a Copa.
Além dos mísseis, a defesa brasileira contará com aviões radar, caças a jato, aviões de ataque leve Super Tucano, helicópteros armados Black Hawk e Ah-2 Sabre e canhões antiaéreos.
Apesar da Fifa não apresentar exigências especificas para a defesa aérea, o governo brasileiro está aproveitando a oportunidade para dar continuidade a um reaparelhamento do sistema de artilharia antiaérea do país, considerado pelos comandantes militares brasileiros como um dos nichos mais defasados das forças armadas nacionais.
De acordo com o especialista norte americano Bill Sweetman, editor-chefe da revista Aviation Week e autor de mais de 50 livros sobre aviação militar, a defesa de um grande evento esportivo em ambiente urbano deve ser planejada em camadas.
A primeira linha tem como função controlar o espaço aéreo; determinar áreas de restrição ao voo nas cercanias dos estádios e usar radares em terra e aviões radar para "saber quem deveria estar lá em cima e quem de fato está".
Então, as informações obtidas nesta operação devem ser concentradas em um só centro de coordenação e decisão. Nessa parte o país está preparado; o controle do espaço aéreo é feito pelos militares, a sua coordenação é unificada e os radares em uso são considerados modernos. Já os aviões radar, modelo E99 da Embraer, tiveram sua modernização contratada junto à fabricante, mas só vão dispor dessas melhorias para a Olimpíada de 2016.
AMEAÇA QUÍMICA
A segunda camada é formada pela aviação militar. Ela é composta por aviões e helicópteros armados de diferentes tipos que devem abordar qualquer aeronave que esteja onde não deve, seja um avião comercial fora de rota, um turista perdido em um ultraleve ou terroristas levando armas químicas em um helicóptero pintado com as cores de um canal de notícias.
Cada tipo de ameaça deve ser confrontada por um tipo de aeronave militar especifico, dependendo da sua velocidade. Aeronaves lentas, como aviões a hélice, helicópteros, ultraleves e até mesmo aeromodelos, seriam abordados pelos aviões de ataque leve Super-Tucano e/ou helicópteros.
Jatos comerciais e executivos que adentrassem a área de exclusão, por sua vez, seriam confrontados por caças supersônicos F-5EM, recém modernizados pela Embraer e armados com mísseis israelenses de ultima geração. Essas abordagens teriam função de identificar, orientar, dissuadir e, em último caso, abater as aeronaves em rota proibida.
A última camada de defesa, a mais interna, seria formada por canhões antiaéreos e por mísseis russos modelo Igla, guiados por sensores infravermelho e lançados dos ombros de soldados posicionados ao redor dos estádios em locais estratégicos. O radar Saber M60, com 60 quilômetros de alcance, e o postos de comando e controle COAAE, ambos recém adquiridos e de concepção e fabricação brasileira, deverão ser os olhos e os cérebros dessas baterias.
Dias de jogos
De uma maneira simplificada, o esquema funcionará assim: em dias de jogos, só aeronaves essenciais voam nos arredores do estádio. Nas horas imediatamente anteriores, durante e logo depois do jogo, somente aviões militares e dos serviços de emergência ficam no ar. Radares móveis em terra e aviões radar varrem o espaço aéreo para se certificar de que ninguém está onde não deve.
Se alguma aeronave fugir dos padrões estabelecidos, vai ser questionada. Se não mudar de curso, será abordada por uma caça ou um helicóptero, que vai identificá-la e escoltá-la para fora da área de exclusão.
Se, em último caso, uma aeronave furar as camadas anteriores e representar perigo iminente, ela será abatida pelos misseis e canhões da artilharia antiaérea. Este equipamento, porém, é considerado obsoleto por especialistas militares, embora isso não signifique que não serão capazes de cumprir a missão.
Para Fernando Valduga, editor do site especializado em aviação Cavok e formado em ciências aeronáuticas pela PUC RS, o sistema disponível no Brasil não é o ideal, mas deverá servir para garantir a defesa das praças esportivas, caso outras áreas de prevenção, como o controle de acesso e movimentação nos aeroportos comerciais e o policiamento das pistas de pouso privadas e clandestinas nas proximidades dos estádio, seja feito de maneira satisfatória.
Fato é, porém, que as defesas antiaéreas brasileiras são de uma geração ultrapassada. A Brigada de Artilharia Antiaérea do Exército Brasileiro está equipada com canhões Oerlikon Contraves de 35 mm e Bofors 40mm que datam do final da década de 70 e começo dos anos 80, com pouca ou nenhuma modernização.
Em relação a mísseis, o país só irá dispor dos modelos russos Igla. O equipamento é considerado moderno, mas de curto alcance, mais apropriado para defender tropas em movimento do que instalações de importância estratégica, como um estádio recebendo um evento esportivo.
Mísseis de defesa de média altitude não estão disponíveis há mais de dez anos, quando foram desativados os sistemas europeus Roland II. Os equipamentos russos Pantsir, comprados através do Projeto Estratégico Defesa Antiaérea em um pacote que pode chegar a mais de US$ 1 bilhão, não chegarão a tempo da Copa.
AMEAÇA DISFARÇADA
Modelo de helicóptero contendo armamentos disfarçado de aeronave pertencente a um canal de notícias |
Em cidades onde o tráfego dos aeroportos passa muito perto do estádio, como o Rio de Janeiro, onde as rotas de aproximação para o Aeroporto Santos Dumont estão a poucos minutos de voo do Maracanã, a falta de uma defesa antiaérea moderna poderia ser um problema. Um avião sequestrado logo depois da decolagem ou pouco antes do pouso teria que ser derrubado por um míssel quase que de imediato, pois não haveria tempo hábil para uma interceptação pelos caças.
De acordo com Bill Sweetman, a defesa antiaérea estaria com a ingrata missão de abater alvos a menos de um minuto para o impacto. Os canhões e misseis de que o Brasil dipõe têm alcance curto demais, e os mísseis guiados por infravermelho poderiam acabar acertando o alvo errado, no caso de haver mais de um avião em locais próximos.
Na opinião do pesquisador Expedito Carlos Stephani Bastos, coordenador especialista em defesa da Universidade Federal de Juiz de Fora, "na falta de meios mais modernos, o Brasil vai ter que se virar com o que tem e torcer para que nada de mal aconteça".
Uma alternativa para reduzir riscos é a interrupção completa de pousos e decolagens nos horários de jogos, manobra que seria viável na Copa, mas não na Olimpíada, quando eventos esportivos acontecem durante varias horas diariamente.
Além de aviões sequestrados, há outras ameaças sendo levadas em consideração pelas Forças Armadas, como veículos aéreos não tripulados carregados com agentes químicos ou explosivos ou mesmo um ataque com foguetes caseiros dos tipos que o Hamas atira sobre Israel, lançados por um grupo terrorista ou facção criminosa das cercanias do estádio.
AJUDA DO TIO SAM
A embaixadora permanente dos Estados Unidos na ONU (Organização das Nações Unidas), Susan Rice, afirmou na tarde desta quarta-feira (17) que os EUA irão colaborar com o Brasil na segurança dos grandes eventos mundiais que o país irá receber.
Olimpíadas
De acordo com o chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, general José Carlos De Nardi, a preocupação maior nessa área é com os Jogos Olímpicos, que apresentam um desafio muito superior ao da Copa Do Mundo, já que o espaço aéreo a ser controlado é muito maior, envolve focos de concentração de público simultâneos e por um período de tempo muito maior.
Nas Olimpíadas de Londres, os ingleses instalaram diversas baterias de mísseis Rapier pela cidade. Em Pequim, os chineses usaram equipamentos de alcance inferior ao do sistema russo Pantsir que o Brasil negocia atualmente, mas da mesma categoria técnica e com tecnologia similar. O Pantsir conta com um conjunto de 12 mísseis guiados por radar, dois canhões automáticos de 30 mm, radar de busca e suíte eletro-óptica em um mesmo veículo. É considerado bastante moderno e já foi exportado para inúmeros países.
De acordo com fontes das Forças Armadas, a compra do equipamento russo Pantsir é uma aquisição acima de tudo necessária. O Exército informa que as verbas para aquisição desses materiais vêm de um fundo específico para a defesa brasileira, não sendo provenientes das reservas criadas para os investimentos do país na preparação para a Copa ou para a Olimpíada.
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